domingo, 31 de agosto de 2014

OS CANDIDATOS QUE FARÃO PELA SAÚDE, PELA EDUCAÇÃO E PELOS IDOSOS





Promessas genéricas não acabam com as filas do SUS. De onde sairá o dinheiro para financiar os serviços com que os brasileiros sonham?

CRISTIANE SEGATTO
REVISTA ÉPOCA 29/08/2014 16h18



Poucos hits da internet traduzem tão bem o vazio de ideias e o deboche do horário eleitoral gratuito quanto o vídeo “Programa Político”, estrelado pelo ator Fábio Porchat, no canal Porta dos Fundos. É uma maravilha:

“Vote naquele que fará pela saúde, pela educação, pelos idosos”, diz o candidato. “Ah, pelos idosos...” E cai na gargalhada. Não vou contar o final para não estragar a surpresa, caso alguém ainda não conheça esse retrato perspicaz dos maus hábitos da nossa política.

Subestimar a inteligência do eleitor é uma prática disseminada. Não sei até quando ela vai funcionar. Mesmo com os imensos déficits de educação do Brasil, hoje qualquer pessoa com acesso à internet pode confrontar afirmações levianas e promessas sem pé nem cabeça com fatos e números. E quem tem disposição e habilidades suficientes para consultar as fontes corretas pode facilmente se transformar num multiplicador de conhecimento por meio das redes sociais.

Sucessivas pesquisas demonstram que a saúde é a maior preocupação dos cidadãos. O que me intriga, eleição após eleição, é a falta de coragem dos candidatos de enfrentar as discussões duras e objetivas sobre o financiamento do sistema de saúde. Ele não vai melhorar enquanto os brasileiros continuarem caindo no conto das medidas emergenciais e eleitoreiras.

O SUS foi criado em 1988 com a melhor das intenções. Se funcionasse como o previsto na Constituição, seria um belíssimo instrumento de justiça social. Para ser justo e universal, para oferecer tudo (todo e qualquer tipo de tratamento) para toda a população (dos mais pobres aos mais ricos), o SUS precisa receber mais dinheiro. E, ainda assim, talvez não fosse possível oferecer todas as novas e caríssimas soluções criadas pela indústria farmacêutica. Nenhum país do mundo consegue fazer isso.

Os cerca de 9% do PIB que o Brasil aplica em saúde (somando-se os recursos públicos e privados) não sustentam o sistema imaginado em 1988. Como resolver a equação? Nesta eleição, ressurgiu a promessa de aplicar em saúde 10% do orçamento da União.

Isso é defendido por muitos especialistas desde os anos 80. É uma ideia justificável. O gasto público do país por habitante (US$ 474, segundo dados de 2010 reunidos pela OMS) é inferior ao gasto da Argentina (US$ 851), do Chile (US$ 562), da França US$ 3.075) e do Reino Unido (US$ 2.857).

Adoraria que o aumento do investimento em saúde pelo governo federal virasse realidade, mas é o tipo de promessa que tem grandes chances de ficar pelo caminho. Ela só poderia acontecer se houvesse um crescimento econômico espetacular – algo distante da realidade brasileira.

Os candidatos que fazem essa promessa precisam dizer com todas as letras como pretendem fazer isso. Vão aumentar impostos? Tirar dinheiro de outros ministérios? A discussão não deve ficar só no dinheiro. O que vão fazer para melhorar a gestão do SUS?

Há medidas impopulares no horizonte, como limitar o atendimento público a determinadas faixas de renda? Garantir o acesso a um determinado pacote de programas, tratamentos e drogas -- e só a eles? O que pretendem fazer para reduzir as ações judiciais de cidadãos que exigem todo e qualquer recurso de saúde – independentemente do preço e de estar ou não disponível no SUS?

Ninguém é capaz de assumir o ônus político de dizer que medidas impopulares podem ser necessárias para tornar o SUS verdadeiramente justo e universal. Sobra emoção e falta racionalidade quando se discute os rumos da saúde.

Se queremos um SUS melhor, precisamos nos armar de calculadoras. Fazer contas, mergulhar em planilhas, cobrar resultados e desprezar os políticos que só dizem generalidades.

São muitas as medidas necessárias para melhorar a assistência à saúde. Uma delas é garantir a correta distribuição dos recursos públicos entre as regiões. Um bom começo é investir na construção de um mapa das reais necessidades de cada região. Isso permitirá que o investimento seja feito de forma correta, na área que mais precisa dela.

Só com organização de alto nível é possível conter desperdício e transformar dinheiro em qualidade de vida. Em alguns estados do Nordeste, por exemplo, o número de mamógrafos disponíveis no SUS encontra-se acima do parâmetro adequado. Mesmo assim, a quantidade de mamografias realizadas está abaixo do esperado. Como isso é possível?

“Muitas mulheres faltam ao exame agendado porque não têm dinheiro para pagar o transporte”, diz o médico David Souza, professor de gestão em saúde do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.

Não há dúvida de que os recursos da saúde são escassos, mas a falta de racionalidade nos três níveis de gestão (governo federal, estados e municípios) produz desperdício sem melhorar a vida das pessoas. Racionalizar, segundo a definição de David Souza, significa o seguinte:

• Fazer um diagnóstico preciso das necessidades de saúde da população
• Construir protocolos de conduta que permitam oferecer o cuidado necessário prioritariamente a quem mais precisa dele
• Regular o acesso a serviços e tratamentos com base nesses protocolos
• Capacitar os profissionais das redes de saúde para que eles possam fazer uma boa gestão dos recursos disponíveis
• Monitorar regularmente a efetividade de todo o processo de regulação

Hospital do Subúrbio, em Salvador (BA) (Foto: Márcio Lima/ÉPOCA)

“Todo médico precisa saber que os recursos são limitados. Isso vale para qualquer sistema de saúde do mundo”, diz Souza. “O exame que ele pede para um paciente faltará a outro”. Por isso, é fundamental que a solicitação seja feita com base em critérios claros e objetivos.

Faremos, daremos, construiremos são os verbos mais usados pelos candidatos quando se referem à saúde. Quem for sincero o suficiente para assumir as mudanças impopulares e necessárias para reorganizar o SUS perde a eleição.

Enquanto os brasileiros não estiverem preparados para ouvir as verdades duras e valorizar os políticos que as defendem, o sistema de saúde vai continuar na mesma. Assim como a balela dos candidatos que “farão pela saúde, pela educação e pelos idosos”.

Que o voto consciente traga um futuro melhor e mais saudável. Com esse texto, me despeço e entro em férias. A coluna volta a ser publicada em outubro. Até lá e boa eleição para todos nós!

NO DF, PRINCIPAL PROMESSA ELEITORAL É NÃO ROUBAR

REVISTA VEJA 30/08/2014 - 08:04


Eleições 2014. No DF, principal promessa eleitoral é ‘não roubar’. Com candidatos envolvidos em casos de corrupção, ataques aos adversários e promessas de um governo honesto viram pano de fundo de campanhas

Marcela Mattos, de Brasília




FAROESTE CABOCLO –(Da esq. para a dir.) Os candidatos ao governo do Distrito Federal: Rodrigo Rollemberg (PSB), Agnelo Queiroz (PT) e José Roberto Arruda (PR) durante debate (Felipe Costa/Futura Press)


“É uma política de faroeste, mas a gente não encontra o mocinho", Paulo Kramer, cientista político da Universidade de Brasília (UnB)

Há mais de uma década, o eleitor do Distrito Federal acostumou-se ao lamentável roteiro de ver seus governadores, assessores e deputados às voltas em escândalos de corrupção. O primeiro senador cassado desde a redemocratização do país, Luiz Estevão, foi eleito pelo Distrito Federal. O primeiro governador preso, José Roberto Arruda, também. Arruda, aliás, é um dos protagonistas das eleições deste ano e lidera as pesquisas de intenções de voto pelo Partido da República (PR). Disputa o cargo com o enrolado governador Agnelo Queiroz, do PT, alvo de três investigações sigilosas no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Depois de participar da violação do painel eletrônico no Senado, em 2001, quando renunciou ao mandato para evitar um processo de cassação, Arruda foi flagrado em vídeo recebendo dinheiro de propina no escândalo conhecido como mensalão do DEM, em 2009. Acabou encarcerado por dois meses, mas isso não o impediu de voltar à cena política. O ex-governador teve o registro cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e aguarda uma definição do Superior Tribunal Federal (STF) sobre a possibilidade de disputar as eleições. Enquanto isso, segue em campanha, afirma ter sido vítima de um golpe, e promete um governo livre de corrupção.

Nestas eleições, Arruda concorre com o apoio de outro ex-governador cuja trajetória também acabou em páginas policiais de jornais. Joaquim Roriz, com base eleitoral nas cidades mais pobres do Distrito Federal, governou a capital do país quatro vezes e agora, impedido de disputar as eleições por ser ficha-suja, tenta manter a influência indicando cargos de confiança em uma eventual gestão Arruda. Além de herdeiros políticos, como o senador Gim Argello (PTB) – que responde a três inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) –, Roriz lançou a mulher, Weslian, como candidata à primeira suplente do Senado. A família também vai às urnas com as filhas Liliane e Jaqueline Roriz, o sobrinho Dedé Roriz e o neto, Joaquim Roriz Neto, que tentam vagas na Câmara Legislativa e na Câmara Federal.

“O Distrito Federal carrega essa mácula da velha política. Brasília são duas cidades: uma na Esplanada dos Ministérios, a da representação oficial, e outra que ainda guarda uma característica de fronteira e atrai muitas pessoas a tentarem a vida aqui”, avalia Paulo Kramer, cientista político da Universidade de Brasília (UnB). “A política não deixa de refletir essa realidade: é uma política de faroeste, mas a gente não encontra o mocinho.”

Telhado de vidro – Suspeitas de corrupção também cercam o segundo colocado na corrida, Agnelo Queiroz, citado no esquema de desvio de dinheiro do programa Segundo Tempo, do Ministério do Esporte, pasta que comandou entre 2003 e 2006. Não para aí: ele também é investigado em esquema de fraudes e cartel durante sua gestão como diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e nas ações que levaram à prisão do contraventor Carlinhos Cachoeira. Mas seu lema é que “a sujeira e a corrupção não podem voltar a ser a marca do DF”.

Se a ascensão de Arruda reflete uma síntese do atraso da política brasiliense, também é reveladora do descontentamento da população com o atual governo de Agnelo, cuja taxa de rejeição é de 43%. Governada por um médico, a capital do país é a unidade da federação que mais investe em saúde por ano – tem um gasto anual de 1.042,20 reais por pessoa –, mas registra o pior número de leitos e o mais baixo índice de cobertura em setores da atenção básica, agentes comunitários e equipes de saúde da família, segundo o Conselho Federal de Medicina. A situação se repete na educação, com índices de aprovação dos ensinos médio e fundamental em queda, na segurança pública, cujo número de furtos e roubos é crescente, no trânsito caótico no Plano Piloto e na descontrolada invasão de terras.

No entanto, em vez de discutir os problemas crônicos da cidade, os principais embates entre os candidatos levam o eleitor a um duelo onde imperam ataques e faltam propostas. Na última segunda-feira, o tema corrupção pontuou o debate promovido pelo SBT. “É impressionante o desprezo com a inteligência do povo do Distrito Federal. O Arruda é o discípulo da inverdade e ele continua com a velha maneira de fazer política”, disse Agnelo. A resposta veio no mesmo tom: “Agnelo, vejo você trêmulo e nervoso porque o seu governo foi um desastre. Quando eu vejo você falar de corrupção eu acho que você está olhando no espelho”.

“O Distrito Federal vive uma situação desmoralizante na política e nos serviços públicos. Os candidatos se concentram apenas em troca de acusações, e o prejuízo fica para o eleitor, que não é apresentado às propostas para reverter os principais problemas da cidade no ano que vem”, avalia David Fleischer, cientista político da UnB.

Terceira via – Empatado com Agnelo Queiroz nas pesquisas, o senador Rodrigo Rollemberg (PSB), que nunca exerceu um mandato no Executivo, preparou um bordão para se colocar como terceira via nas eleições deste ano: “Brasília não merece nem incompetência nem o ‘rouba mas faz’”. Ainda assim, o socialista está longe de ser uma renovação política: iniciou a carreira pública em 1995, na Câmara Legislativa, passou pela Secretaria de Turismo durante o governo do então petista Cristovam Buarque e foi aliado de Agnelo Queiroz até dezembro de 2012, quando desembarcou do governo para ajudar nos primeiros passos pela candidatura de Eduardo Campos à Presidência da República.

As alianças com a velha política que domina o DF se repetem nos outros dois principais candidatos, que também se colocam como renovação: o deputado Luiz Pitiman (PSDB) foi presidente da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) no governo de Arruda e, depois, secretário de Obras de Agnelo. O candidato Toninho do Psol, até os anos 2000, disputava as eleições como o Toninho do PT.

Sem debate de propostas nem renovação política, a principal promessa eleitoral no Distrito Federal é "não roubar".

A NOVA ROUPA DA VELHA POLÍTICA

REVISTA ISTO É N° Edição: 2336 | 29.Ago.14


No discurso, Marina Silva se apresenta como novidade, mas para chegar ao poder a candidata do PSB recorre a antigas práticas

Josie Jeronimo 


O currículo da candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva, 56 anos, enumera passagens por pelo menos três partidos, mandatos parlamentares nas esferas municipal, estadual e federal e o comando de uma pasta ministerial num governo do PT. Desde os 30 anos, Marina vive e respira política, nos moldes ditados pelo sistema partidário. Apesar disso, Marina diz encarnar a “nova política”. É enfática em seus discursos ao frisar que não compactua com o vale-tudo eleitoral e o modelo de alianças adotado por PT e PSDB nos últimos 20 anos. A utopia da candidata, ao pregar uma nova era política, rendeu a seus apoiadores o cativante apelido de “sonháticos”. A oratória envolvente de Marina embala milhões de brasileiros desencantados com “tudo o que esta aí”. Com o verniz da “nova forma de fazer política”, ela mascara as antigas e surradas práticas tão presentes em sua candidatura e biografia.


CAIXA2?
Entrevistada pelo "Jornal Naciona", Marina Silva não conseguiu
explicar o empréstimo do jato utilizado por Eduardo Campos durante a
campanha - a Polícia Federal investiga a origem do dinheiro usado para comprar o avião

Desde o início da campanha, Marina tem condenado as alianças forjadas única e exclusivamente, segundo ela, para alcançar o poder. No entanto, foi por pura conveniência política, nada menos do que isso, que ela aderiu ao PSB quando precisou escolher entre manter a coerência do discurso ou ficar alijada das eleições de 2014. Em setembro de 2013, antes de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sepultar as esperanças de Marina em lançar candidatura presidencial pela Rede Sustentabilidade, ela produziu um duro artigo contra o PT, comparando a legenda que a criou politicamente a um camaleão que se mimetiza para sobreviver. “Adaptou-se ao que antes combatia”, escreveu. Marina é rígida com as adaptações dos adversários, mas muito sucinta ao explicar seus ajustes.

A composição, por exemplo, com o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), seu vice, exigiu esclarecimentos. Marina é a candidata que diz não receber doações da indústria armamentista, barra projetos do agronegócio no Congresso e não aceita intervenção da ciência no ciclo natural da vida, posições opostas às de seu vice. Nas últimas eleições, o deputado federal Beto Albuquerque recebeu doação de R$ 30 mil da Associação Nacional da Indústria de Armas e Munições (Aniam), que tem como filiadas a Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC) e a Taurus.

Recentemente, Marina reiterou ao PSB sua posição sobre a questão: “Estabelecemos que não iríamos receber nenhum tipo de doação da indústria do tabaco e da indústria bélica. Esses compromissos nós continuamos com eles. É uma mensagem de que defendemos uma cultura de paz. Queremos trabalhar com a ideia de promoção da saúde”, afirmou. Nada disse sobre a arrecadação feita por seu vice.



Em entrevista ao “Valor”, o candidato a vice se justificou: “É claro que ela sabe. Ela não veio para o PSB para ser PSB, assim como não nos coligamos com a Rede para sermos Rede. Nós somos de partidos diferentes” afirmou Albuquerque. O que para os adversários inspiraria um estrondoso rótulo de aproximação por interesse, na nova política de Marina Silva ganhou tratamento diferenciado. “Nós somos diferentes e a nova política sabe trabalhar na diversidade”, argumentou em sua entrevista no “Jornal Nacional”, na noite de quarta-feira 28.

Marina defende as ideias de seu vice, mas prega distância de outros políticos tradicionais filiados ao PSB, como o deputado federal Heráclito Fortes (PSB-PI) e Paulo Bornhausen, outro ex-integrante do DEM de Santa Catarina convertido ao socialismo. Marina foge para não encontrar os parlamentares nos palanques estaduais. Embora imersa nas águas das velhas práticas, ela não quer parecer contaminada e provoca a ira de antigos militantes. Em tom de provocação, Severino Araújo – presidente do PSB do Paraná, tesoureiro da executiva do partido e ex-secretário de Miguel Arraes – conta que confeccionou 28 milhões de santinhos com a dobradinha de Marina Silva e o tucano Beto Richa, candidato à reeleição no Estado. Ele desafia a candidata à Presidência a vetar o material de campanha e alega que ela sabia dos termos durante o período de convenções. Mesmo assim, permaneceu no partido. “Se ela não quiser foto junto com outros candidatos, tem que fazer outra convenção. Não aceitamos. Essa coisa de nova política não tem a menor lógica. É um sonho, mesmo, como eles dizem.”



Quando confrontada, Marina recorre a um desgastado artifício das velhas raposas. A tática do “eu não sabia” entrou em debate quando a candidata foi instada a responder sobre ilegalidades no processo de compra da aeronave utilizada pelo PSB para os deslocamentos da comitiva da campanha presidencial. O comportamento, típico dos políticos descolados em driblar a opinião pública, veio acompanhado do clássico brado por investigações. “Meu compromisso é com a verdade. A verdade não virá pelo partido nem pela imprensa e sim pela Polícia Federal”, afirmou Marina em entrevista ao “Jornal Nacional”. A PF investiga o caso e uma das hipóteses é que a aeronave tenha sido comprada com recursos de caixa 2. Loteamento de cargos é outro tema favorito da candidata para atacar os adversários. Porém, a amizade de Marina com o governador do Acre, Tião Viana (PT) garantiu cargo de secretário a seu marido, o técnico agrícola Fábio Vaz de Lima. Somente após Marina assumir a candidatura presidencial ele se afastou da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Florestal, da Indústria, do Comércio e Serviços Sustentáveis.

Analistas políticos acompanham com cautela a retórica de Marina. Apesar de a prática ser outra, a candidata consegue dizer o que o povo quer ouvir e trabalha bem com o imaginário popular, resume o cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Kramer. “Nova política é um rótulo tão gasto que deu nome a uma coleção de discursos de Getúlio Vargas na década de 1950. É um conceito para consumo externo, cativa as grandes massas desencantadas com os partidos políticos”, afirma o especialista.

PROPAGANDA ENGANOSA

REVISTA ISTO É N° Edição: 2336 | 29.Ago.14



Apresentado como um humilde lavrador, personagem de programa eleitoral de Dilma é, na verdade, secretário de Agricultura de município gaúcho pelo PT

Claudio Dantas Sequeira 


Um homem humilde sentado à mesa da cozinha revê fotos antigas. Em seguida, levanta a cabeça e agradece a Deus. Com a voz embargada pela emoção, José Veit fala das dificuldades que no passado obrigaram seu filho Odair a trocar o campo pela cidade. “Ele trabalhou comigo desde pequenino. Saiu porque não tinha perspectiva de ter futuro na agricultura. Mas graças a Deus hoje está comigo”, diz. Na cena seguinte, o filho surge numa estrada de chão pilotando um trator, enquanto a voz da locutora explica que ele voltou porque, com Lula e Dilma Rousseff, “o apoio à agricultura familiar cresceu como nunca”. A propaganda é feita para convencer o eleitor de que aquela é uma história real, igualzinha à de milhões de brasileiros que vivem no campo. Mas Veit não é um simples lavrador, e sim uma autoridade a serviço do próprio PT de Dilma.


REALIDADE PARALELA
Na TV, José Veit fala das dificuldades que obrigaram
seu filho a trocar o campo pela cidade

Veit é petista e secretário de Agricultura de Bom Princípio, município de 12 mil habitantes localizado a 72 km de Porto Alegre (RS). Ele foi indicado para o cargo em junho do ano passado por um acordo político firmado na campanha de 2012 entre PT e PMDB, que dividem o poder local há mais de uma década. Veit também preside a Ecomorango, cooperativa de produtos orgânicos criada há 14 anos em parceria com outro petista, o vice-prefeito Luiz André Steffen, que também foi secretário de Agricultura na última gestão do peemedebista Jacob Siebel, condenado por crime contra as finanças públicas.

Com tal currículo, surpreende que a campanha do PT tenha escolhido logo José Veit. Certamente, havia opções. Outros agricultores locais, inclusive, se queixaram da aparição do secretário na propaganda em rede nacional. “Os colegas mexeram comigo”, admite Veit. Ouvido por ISTOÉ, ele contou que foi procurado no ano passado por uma equipe do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para uma ação de cadastramento e não soube dizer como virou personagem da propaganda de Dilma. Tampouco vê qualquer conflito de interesses ou risco à credibilidade da campanha.



O recrutamento do secretário do PT revela um amadorismo impensável para uma produção comandada por quem é considerado o maior marqueteiro do País, João Santana. Há dúvidas também sobre a versão contada na TV, segundo a qual Odair voltou para a roça graças aos programas do governo federal. Na verdade, o rapaz tentou a sorte na cidade vizinha de São Sebastião de Caí. Entrou numa faculdade privada, mas foi obrigado a abandonar os estudos após dois anos. “Era muito caro”, explica o pai. De volta à cidade natal, Odair ainda tentou concurso para contador da prefeitura em 2012, mas não passou. No ano passado, ingressou no Pronatec. Procurado, o PT alegou que o fato de ele estar ocupando um cargo em um município de pouco mais de 11 mil habitantes “não apaga que ele e sua família têm toda uma vida dedicada à agricultura familiar”.

Esta não é a primeira falha na campanha de Santana. Na semana passada, a imprensa notou que a propaganda oficial de Dilma estava usando para ilustrar seus tempos de militância armada a reprodução de uma ficha criminal falsa, cuja publicação anos atrás foi duramente criticada pela própria presidenta. Outro caso foi o da agricultora Marinalva Gomes, a dona Nalvina, que ganhou do governo uma dentadura às vésperas da gravação de um dos programas eleitorais. Contratado ao custo de algumas dezenas de milhares de reais, Santana surpreendeu negativamente ao usar na campanha de reeleição da petista o slogan “Coração Valente”, o mesmo que ilustrou a candidatura presidencial da ex-senadora Heloísa Helena (PSol) em 2006. Pelo visto, está faltando criatividade ao PT.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

DIVIDA PÚBLICA DO RS DOMINA DEBATE


Dívida pública do Estado domina debate entre candidatos ao governo do RS. Seis dos oito candidatos participaram de embate na noite desta quinta-feira

ZERO HORA Atualizada em 29/08/2014


Seis dos oito candidatos ao governo do Estado participaram do debateFoto: Mateus Bruxel / Agencia RBS


A dívida pública de R$ 50,4 bilhões do Rio Grande do Sul dominou o debate da Rede Bandeirantes entre os candidatos ao governo do Estado na noite desta quinta-feira — a exemplo do ocorrido na terça, no pronunciamento dos quatro principais candidatos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Críticas à tentativa de renegociação do débito pelo governo de Tarso Genro (PT) e soluções para as finanças gaúchas predominaram entre os discursos de Ana Amélia Lemos (PP), João Carlos Rodrigues (PMN), José Ivo Sartori (PMDB),Roberto Robaina (PSOL), e Vieira da Cunha (PDT).

Confira, abaixo, os principais momentos do embate:

1º bloco

Cada candidato escolhia outro concorrente para fazer uma pergunta de tema livre. Sartori e Ana Amélia iniciaram o programa trocando perguntas com críticas ao atual governo — o que foi classificado por Vieira da Cunha como "dobradinha".

— Entendo que o atual governo não entrega os serviços que a população deseja, provocou um endividamento recorde. Gostaria de saber como você irá encaminhar essas mudanças — questionou Sartori.

— Nós temos mais de 6 mil cargos comissionados. Só no gabinete do governador e do vice-governador são 12, com status de secretário. São cargos desnecessários e muito caros — atacou a candidata pelo PP que, na sequência, citou o projeto de desoneração da Lei Kandir com o débito do contrato com a União.

Em seguida, Tarso direcionou sua pergunta a João Carlos Rodrigues para rebater as críticas. O governador apontou o que classificou como "conquista histórica do Estado de rebaixar a dívida em R$ 15 bilhões" contratada por outros governos. Vieira retomou as perguntas, direcionando sua questão ao governador.

— Não tem conquista nenhuma na dívida. O projeto está empacado no Senado por determinação do ministro da Fazenda do governo Tarso Genro. Que conquista é essa? — indagou Vieira.

— Tu poderias confiar nos três quadros do PDT que trabalharam conosco para ajudar nesse impulso político de renegociação da dívida e deram força para o Estado ter um governo que, pela primeira vez, chegou perante o governo federal, confrontou e discutiu perante a área econômica e depois teve a consagração da palavra da oposição que aceitou a votação em novembro — rebateu o candidato pelo PT.

Robaina questionou Vieira como pretendia pagar o piso do magistério, e respondeu a João Rodrigues sobre medidas no setor rural.

2º bloco
Jornalista fizeram perguntas aos candidatos. As questões abordaram temas como a demora para obtenção de licenças ambientais, o modelo de manutenção das rodovias por meio do Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer) e da Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), a recuperação das indústrias gaúchas, segurança pública e educação. O principal embate do bloco girou, justamente, em torno do tema ensino, quando Robaina questionou Tarso sobre o piso do magistério.

— Pagamos para aqueles professores que não chegaram ao piso um completivo e estamos aguardando a decisão do Supremo para ver qual o piso definido — disse o governador.

— O completivo que está falando é o que a Yeda (Crusius) queria fazer e a luta com o magistério impediu, que é a destruição do plano de carreira dos professores e funcionários de escola — apontou o candidato do PSOL. — Vocês estão tentando enfiar na comunidade escolar uma reforma do ensino que reduz carga horária de matérias fundamentais, como matemática e português — disse.

— Não houve redução. Permanece a mesma e aumentamos a carga horária de outras matérias para introduzir o ensino politécnico. Isso é uma fraude informativa — respondeu Tarso.

3º bloco

Cada candidato escolhia quem lhe fazia a pergunta. Vieira abriu o bloco questionando Ana Amélia sobre as críticas do candidato à Presidência Aécio Neves (PSDB) à candidata Marina Silva (PSB).

— Considero importante para quem vai assumir o Estado com esse grau de dificuldades ter experiência administrativa, que eu não vejo na prezada candidata, que tem metade do seu mandato como senadora — disse Vieira.

— O fato de ter experiência não significa que seja um bom gestor e que essa experiência tenha valido a pena. Têm maus gestores, veja a situação do Estado — rebateu Ana Amélia, que também citou a trajetória do presidente Lula.

Na sequência, Sartori retomou o tema educação em pergunta a João Carlos Rodrigues.

— O mais importante, na posição de governador, é ser coerente em seu discurso e respeitar a lei — disse o candidato do PMN, em referência ao pagamento do piso do magistério.

— Temos de ter um ensino de qualidade, e só se faz isso com professores valorizados — apontou o ex-prefeito de Caxias do Sul.

Ainda no bloco, Ana Amélia questionou Vieira sobre as condições de infraestrutura das estradas, criticando a gestão da EGR. O candidato do PDT se posicionou favorável às parceirias público-privada. Robaina e Tarso ainda trocaram acusações sobre alianças políticas.

4º bloco

Cada candidato escolhia a quem iria perguntar. No penúltimo bloco do programa, Tarso questionou Ana Amélia sobre a proposta da senadora de cortes nos gastos públicos.

— Gostaria de saber quais as secretarias que a senhora vai extinguir, qual o número de CCs que a senhora vai reduzir e qual a influência que isso vai ter nas finanças do Estado?

— O primeiro passo é ter uma atenção especial às atividades meio, e não às atividades fim, que impactam diretamente na vida do cidadão — disse Ana Amélia. — São 6 mil cargos comissionados e com cargos mais altos do que os próprios concursados e que representam um gasto — completou.

— Se a senhora terminar com um terço desses CCs, o impacto será de 0,3% na folha de pagamento. Não tem nenhum possibilidade de isso implicar no ressarcimento da dívida da União — afirmou Tarso.

— Há 12 anos, o seu partido está no poder e, se quisesse ter ajudado o Rio Grande do Sul a resolver esse problema, já teria feito. Eu tentei votar a questão do indexador da dívida no ano passado, o que beneficiaria o seu governo agora — rebateu Ana Amélia.

Robaina ainda questionou o governador, novamente, sobre a renegociação da dívida do Estado. Vieira também apresentou números da violência e confrontou Sartori, que apontou sua experiência como prefeito de Caxias do Sul.

5º bloco

Os seis candidatos fizeram suas considerações finais após uma pergunta comum a todos: "que medidas o seu governo tomaria para resgatar o protagonismo histórico nacional do Rio Grande do Sul?"

DISPUTA PELO PIRATINI NA TV



ZH 29 de agosto de 2014 | N° 17906

ELEIÇÕES 2014


A discussão sobre a dívida pública do Estado com a União abriu o primeiro debate na TV entre os candidatos ao Piratini. José Ivo Sartori (PMDB) e Ana Amélia Lemos (PP) iniciaram o programa, exibido ontem pela Rede Bandeirantes, em uma troca de perguntas com críticas ao atual governo. 

Na sequência, o candidato à reeleição Tarso Genro (PT) usou sua pergunta a João Carlos Rodrigues (PMN) para rebater a críticas. Em seguida, o candidato Vieira da Cunha (PDT) classificou os diálogos anteriores como “tabelinha”, e voltou a questionar Tarso sobre o problema da dívida. Roberto Robaina (PSOL) perguntou a Vieira como pretendia pagar o piso do magistério, e respondeu a João Rodrigues sobre medidas no setor rural. 

Até o fechamento desta edição o debate não havia encerrado.


VOU CONTRARIAR INTERESSES E TOMAR MEDIDAS AMARGAS

ZH 29 de agosto de 2014 | N° 17906



ENTREVISTA LUCIANA GENRO
Candidata do PSOL à Presidência



A candidata à Presidência Luciana Genro (PSOL) prometeu ontem, em Porto Alegre, adotar “medidas amargas” para colocar o Brasil nos eixos – o que para ela significa libertar o país do jugo do mercado financeiro e dos grilhões do grande capital.

Segunda entrevistada do Painel RBS – a primeira foi Dilma Rousseff (PT) –, Luciana afirmou que, se eleita, irá “contrariar interesses”.

Reafirmou a intenção de taxar grandes fortunas, extinguir isenções fiscais para bancos, aumentar a tributação sobre lucros e suspender o pagamento da dívida.

A candidata reclamou do tratamento desigual da mídia e criticou adversários que adotam o “discurso fácil”:

– Quem não demonstra quais interesses vai contrariar, mente. Porque, na prática, depois das eleições, vai deixar de lado todas as promessas e vai continuar reproduzindo a mesma velha política.

Filha do governador e candidato à reeleição Tarso Genro (PT), a ex-deputada recusou-se a avaliar a gestão do pai. Já ao governo Dilma, deu “nota zero”, por entender que “o PT não cumpriu a sua missão histórica”.

Sobre a fama de radical, garantiu não se importar, mas reconheceu que o termo tem “conotação negativa”:

– Isso significa não querer simplesmente paliativos, atalhos, mas realmente querer mudanças estruturais e lutar por elas até o fim.

A seguir, os principais pontos da entrevista concedida aos jornalistas Carolina Bahia, Rosane de Oliveira e Tulio Milman.

O IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS

Não coloco o imposto sobre grandes fortunas como a solução para todos os problemas. É que meu tempo de TV é tão pequeno que a gente acaba tendo de simplificar muito as coisas. Mas nós temos uma plataforma ampla de medidas, que começa com uma revolução na estrutura tributária, na qual o imposto sobre as grandes fortunas é uma das medidas. Pelos nossos estudos, devido à grande concentração de riqueza que existe no Brasil, poderíamos arrecadar R$ 90 bilhões com esse imposto. Tenho insistido na ideia de que não quero tributar mais os riquinhos. Quero tributar mais os ricaços. A partir de R$ 50 milhões, a pessoa pagaria uma alíquota de 5% ao ano sobre todo o patrimônio pessoal, independentemente dos outros impostos que tenha pago. É um imposto para realmente fazer distribuição de renda. Está na Constituição, não sou eu que estou inventando.

A POLÍTICA ECONÔMICA

É preciso mudar completamente a lógica da política econômica. Por exemplo: em relação ao câmbio, precisamos ter controle de capitais. O câmbio não pode estar submetido à lógica de emissão de títulos para captar os dólares que entram de uma forma completamente irresponsável e são livres para sair no momento em que desejam. É preciso que o câmbio esteja submetido a uma lógica de interesse do país. Precisamos de dólares ou precisamos aumentar a emissão de reais? Essa é uma decisão que tem de ser tomada pelo Banco Central, mas ele não pode estar completamente submetido à lógica do mercado financeiro. Por que o Brasil tem de pagar a maior taxa de juros do mundo, se na Europa e nos Estados Unidos a taxa é quase zero? Isso faz com que o Brasil se escravize em relação ao capital financeiro.

POLÍTICA PARA CONTER A INFLAÇÃO

Mais de 60% da inflação dos últimos 20 anos foi fruto dos preços administrados pelo governo. Gasolina, luz, plano de saúde, escolas privadas, preços que o próprio governo determina. Eu seguraria a inflação, em primeiro lugar, a partir de uma mudança na lógica da produção de alimentos, com um modelo agrícola voltado para a pequena e média agricultura e a produção para consumo interno. E também a partir das tarifas administradas pelo governo. Vou segurar o preço da gasolina e o preço da luz. O recurso público (para bancar essa política) vai vir da mudança na estrutura tributária e do questionamento da dívida pública, que será auditada, assim como fez o Equador, que conseguiu anular 75% do passivo.

MEDIDAS AMARGAS

O Brasil sempre tomou medidas amargas para o povo e nunca para o capital. É claro que vou tomar medidas amargas, só que para o outro lado. Por isso tenho dito muito claramente: não vou governar para todos. Vou contrariar interesses. Quem diz que vai governar para todos acaba governando para os mesmos de sempre. O imposto sobre as grandes fortunas é uma medida amarga. O fim das isenções fiscais para setores da economia, como os bancos, é uma medida amarga. O aumento da tributação sobre os lucros é uma medida amarga. A suspensão do pagamento da dívida pública, principalmente a parte que vai para os bancos, também é.

MANIFESTAÇÕES DE JUNHO

O principal resultado foi uma maior consciência do povo da força que tem, porque a gente viu que as elites políticas tremeram naquele momento. Quando o povo tomou as ruas, muitas promessas foram feitas, poucas foram atendidas. O resultado concreto: o preço da passagem caiu, o voto secreto na Câmara terminou. Isso foi muito pouco em relação ao tamanho da mobilização. Isso tem a ver, para mim, com uma característica que foi a beleza e o problema de junho, que é a espontaneidade, a falta de uma direção política para o movimento. Quando Lula chegou ao poder, houve certa domesticação do movimento social mais institucionalizado. Junho rompeu com isso, passando por cima, inclusive, de sindicatos. Isso mostrou que já não há mais um controle, mas, ao não haver uma direção com pauta clara, com interlocutores claros, isso também dificulta a obtenção de vitórias categóricas e mais consistentes.

DOAÇÕES DE EMPRESAS PARA CAMPANHAS

O PSOL tem regra estatutária para lidar com isso. Não permitimos doações de bancos, empreiteiras e multinacionais. Existem setores da economia que têm relações promíscuas com o poder público e que não é saudável receber esse tipo de dinheiro.

A REESTATIZAÇÃO DE EMPRESAS

Há todo um arcabouço legal para que se possa fazer isso. Mas, por convicção, acredito que é fundamental que setores estratégicos do país estejam sob controle público. A energia e a telefonia são estratégicos. Obviamente que a partir de uma eleição e de uma vitória eleitoral do PSOL não é viável do dia para a noite se reestatizar tudo. Mas se o setor privado não aceita um congelamento de tarifas, por exemplo, e começa a boicotar o governo e a provocar apagões, isso vai gerar uma brecha legal para que se possa fazer a reestatização. É preciso discutir o que é uma empresa estatizada, porque hoje o Estado é uma burocracia que não tem controle público.

COMBATE À BUROCRACIA PELO CORTE DE CC

Grande parte da explicação para que obras não andem tem a ver com corrupção. Há uma relação muito promíscua entre os setores público e privado. Muitas vezes as empreiteiras acabam fazendo chantagem com os governos para aumentar o valor das obras. É só observar que o valor que elas ganham na licitação nunca é o valor final. O problema da licença ambiental tem a ver com a desestruturação do setor público e a falta de pessoal para fazer os estudos necessários. Temos de valorizar o servidor de carreira. Vou reduzir drasticamente os cargos de confiança, ao menos pela metade, e promover concursos públicos. O objetivo com o corte de cargos não é economizar. É qualificar. É dar ao servidor de carreira melhores condições de trabalho e maior protagonismo.

PAPEL DAS INSTITUIÇÕES

As instituições têm papel fundamental. O problema é quando estão completamente desconectadas da vontade popular. E o que nós vemos hoje, particularmente em relação ao Parlamento, é uma desconexão. Por isso, convocaria uma assembleia nacional constituinte para reorganizar essa estrutura política, para valorizar mais os mecanismos de democracia direta. Seria uma reforma ampla. Entendo que é preciso rediscutir o conjunto das instituições. É óbvio que o Ministério Público é uma instituição fundamental e que tem de ter independência, a Polícia Federal tem de ter independência. Mas os representantes eleitos pelo povo não podem ter independência em relação ao povo.

O FIM DO FATOR PREVIDENCIÁRIO

Vou acabar com o fator previdenciário e mudar, rediscutir essa visão de que a Previdência é deficitária. Ela tem de ser vista dentro da seguridade social, que não é deficitária. A gente não pode ver a Previdência só como “o que eu pago e o que eu recebo”. É um esforço do conjunto da sociedade para garantir a aposentadoria das pessoas idosas, depois que já contribuíram. Ainda voltaria a vincular o reajuste dos aposentados com o do salário mínimo, que foi outra herança maldita deixada por Fernando Henrique, que o PT foi contra, assim como foi contra o fator previdenciário, e que depois que chegou ao poder manteve.

PROGRAMA MAIS MÉDICOS

Esse programa do governo dialogou com uma preocupação e um problema real do povo, que é a falta de médicos. Mas prefiro um programa que estabeleça uma carreira para os médicos. O médico é tão importante quanto um juiz ou um membro do Ministério Público. Ter carreira ajudaria a resolver o problema dos médicos que não querem ir para pequenos municípios. Se isso fizer parte de uma carreira, que o médico sabe que vai ter para a vida toda, inclusive com a aposentadoria garantida, ele vai. Como medida emergencial, não acabaria com o Mais Médicos até que o problema fosse sanado. Mas a terceirização, porque na prática é isso, e a concessão de bolsas não são dignas para uma profissão tão importante. Aliás, para nenhuma profissão.

CONTINUIDADE DO BOLSA FAMÍLIA

Representa 0,5% do orçamento do país. É um gasto muito pequeno em relação ao tamanho do problema que nós temos de pobreza. Inclusive o valor que o governo estabelece, de R$ 70, não é reajustado desde Lula. Eu manteria o programa e aumentaria os gastos com o Bolsa Família, na medida em que diminuiria os gastos com o “bolsa banqueiro”, mas, obviamente, como um programa transitório. Se pretendo desconcentrar renda e gerar crescimento do emprego, posso ter uma perspectiva de saída desse processo de assistência social.

O PISO NACIONAL DO MAGISTÉRIO

Não tem outra saída: criar um fundo do governo federal para ajudar os Estados a pagar o piso dos professores. Com mudança na lógica da economia, questionando o esforço fiscal brutal que os Estados e que a União têm de fazer para pagar os juros da dívida pública, é possível abrir maior espaço fiscal para os Estados terem mais recursos para pagar o piso e, ao mesmo tempo, a própria União contribuir para isso, a partir de um fundo nacional que possa ajudar os Estados em maior dificuldade a garantir o piso.

A SAÍDA PARA A DÍVIDA DOS ESTADOS

Minha primeira medida como presidente seria renegociar esses contratos da dívida. Aliás, coisa que o PT defendeu muito aqui, na época do Olívio, inclusive com uma ação judicial. O próprio governador Tarso Genro também defendeu isso e não consegue, com o governo Dilma. Essa mudança do índice de correção não vai resolver o problema imediato. Vai possibilitar maior endividamento do Estado, mas não vai reduzir o desembolso mensal.

PAPEL DAS FORÇAS ARMADAS

É um papel de garantia de nossa soberania, de nossas fronteiras. Em hipótese alguma pode ter um papel de segurança interna, até porque as Forças Armadas são treinadas para a guerra e, portanto, não podem lidar com a população. E vou além, defendo a desvinculação das polícias das Forças Armadas, a desmilitarização, porque essa lógica da guerra que permeia as Forças Armadas também está incrustada nas polícias. É por isso que elas vão para as favelas executando. Defendo que a polícia tenha o papel de proteção e não de violência.

GOVERNOS DILMA E TARSO

Para Dilma, eu vou dar nota zero. Não é que ela não tenha acertado nada, porque nota é simbólica, muito arbitrária. Mas vou dar zero porque o PT tinha responsabilidade de fazer mudanças estruturais, na forma de fazer política, no combate à corrupção, no incentivo a maior participação da população nas decisões, na mudança na estrutura econômica. O PT se construiu como um partido que buscava essas transformações e, quando chegou ao poder, se adaptou à mesma lógica que combatia quando era oposição. Para meu pai, não vou dar nota nenhuma. Acho que não convém.

A RELAÇÃO COM TARSO

Tenho grande admiração pelo meu pai. Nossa relação nunca foi abalada por nossas diferenças políticas. Admiro ele inclusive pela visão crítica e e pela luta que faz dentro do PT. Ele acredita que ainda vale a pena lutar dentro do PT para mudar esses rumos. Então, tenho enorme respeito e carinho por ele como pessoa e admiração como político, mas não concordo com o caminho que escolheu.

O RÓTULO DE RADICAL

A esquerda europeia tem orgulho de ser chamada de radical, porque lá essa palavra não tem a conotação negativa estabelecida aqui. Não me importo de ser chamada de radical, sempre fazendo a ressalva de que sou radical não no sentido de não dialogar, de não ter disposição de transigir, mas de ser radical no sentido de ir à raiz dos problemas. Isso significa não querer paliativos, atalhos, mas querer mudanças estruturais e lutar por elas até o fim.


sábado, 23 de agosto de 2014

CAMPANHA POSTIÇA


FOLHA.COM 23/08/2014 02h00


EDITORIAL



Em sua vida de privações, a trabalhadora rural Marinalva Gomes Filha pode se considerar uma mulher de sorte. Escolhida para participar de uma gravação de imagens para a campanha da presidente Dilma Rousseff (PT), dona Nalvinha, como é chamada pelos conhecidos, foi agraciada, na véspera, com uma prótese dentária.

A moradora do sertão baiano também se viu contemplada com melhorias em sua casa: o velho fogão a lenha foi ampliado e ganhou um muro de proteção. Beneficiária do programa Água para Todos e de um convênio firmado entre o governo federal e o da Bahia, ela mereceu tratamento preferencial para representar o povo na TV.

A prótese e as obras domésticas que favoreceram dona Nalvinha estão em perfeita sintonia com os cânones da propaganda eleitoral. É também um Brasil postiço que se tem visto nessa primeira semana de programas e inserções dos candidatos no rádio e na TV.

Enquanto Dilma Rousseff apresenta gente feliz e um país transformado em canteiro de obras, a avançar como nunca na infraestrutura, os seus oponentes, sobretudo Aécio Neves (PSDB), carregam nas tintas para pintar um Brasil fracassado, que parece caminhar rumo a um futuro de trevas.

De Marina Silva, cuja campanha na TV começa de fato hoje, dificilmente se poderá esperar mensagens menos fantasiosas. Suas promessas de realizar uma "nova política", por exemplo, esbarram não apenas nos inevitáveis acordos eleitorais como na evidência de que é impossível governar de um palácio imaculado e flutuante, acima dos embates da realidade.

A campanha do PSB, aliás, também já havia sido vítima de efeito semelhante ao ilustrado pela trabalhadora rural. Edivaldo Manoel Sevino, dono de uma casa em Osasco que serviria como "comitê voluntário" da coligação, surpreendeu ao explicar os motivos que o levaram a oferecer sua residência.

Questionado durante uma gravação, foi ao ponto: "Me prometeram 'unzinho'", disse, enquanto fazia com a mão um gesto que indicava a expectativa argentária. O vídeo, claro, foi engavetado.

Transformados em produtos publicitários no modelo vigente do horário eleitoral gratuito –na realidade remunerado com recursos públicos–, os candidatos repetem um padrão postiço que mais investe em truques de marketing do que na discussão realista de propostas.

Nessa toada, os verdadeiros derrotados são os eleitores –até mesmo a agradecida dona Nalvinha e o sincero Edivaldo

CONTRA CRISE, CANDIDATOS APELAM PARA BRASÍLIA




ZERO HORA 23 de agosto de 2014 | N° 17900

CARLOS ROLLSING


ELEIÇÕES 2014. FINANÇAS PÚBLICAS

PROPOSTAS DE CAMPANHA para resolver problemas financeiros não estão focadas no Palácio Piratini



Os remédios apresentados pelos quatro candidatos a governador melhor colocados nas pesquisas para superar a crise financeira não dependem diretamente deles, mas da sensibilidade do governo federal.

Para Ana Amélia Lemos (PP), José Ivo Sartori (PMDB), Tarso Genro (PT) e Vieira da Cunha (PDT), o caminho é renegociar a dívida com a União, rever a concentração da arrecadação em Brasília e resgatar reembolsos previstos pela Lei Kandir.

Além de depender da boa vontade do poder central, as medidas são difíceis de serem executadas porque forçariam o Palácio do Planalto a abrir mão de receitas em momento de crise.

– O espaço fiscal para o governo federal absorver desequilíbrios dos Estados é nulo – opina Fábio Giambiagi, economista e especialista em finanças públicas, com passagem pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento.

O momento é delicado porque o limite de endividamento foi esgotado com a assinatura de um empréstimo do Banco Mundial, no valor de R$ 280 milhões, pelo governo Tarso. É o recurso que garantirá fôlego até o final de 2014.

O expediente de recorrer aos depósitos judiciais (dinheiro de terceiros guardado em juízo enquanto não há decisão sobre uma disputa) também chegou ao limite. Como já tomou emprestado R$ 6 bilhões desse fundo, o Estado atingiu o patamar máximo de 85% de saques do total depositado.

Para 2015, admitiu na quinta-feira o secretário estadual da Fazenda, Odir Tonollier, será necessário “fazer escolhas”. Isso significa que, para quitar a folha de pagamento, a alternativa do futuro governo a ser eleito será enxugar outras áreas.


Um rombo maior do que a dívida


Se a dívida com a União consumiu R$ 2,7 bilhões dos cofres estaduais em 2013, o déficit com a previdência pública drenou R$ 6,5 bilhões, mais do que o dobro. Principal dificuldade estrutural das finanças gaúchas, a previdência é um problema sem solução imediata.

Especialistas apontam que o cenário se cristaliza em decorrência das aposentadorias especiais concedidas a professores, policiais militares e civis e servidores da Susepe, as maiores categorias do funcionalismo. Com as regras atuais, homens deixam a ativa com 30 anos de serviço e mulheres com 25.

No caso do magistério, é necessário ter idade mínima de 50 anos. No setor da segurança, não há essa exigência. A situação leva o Estado a ter aposentados com até menos de 50 anos. Atualmente, a folha de pagamento tem 53% de inativos.

– Cedo ou tarde, os benefícios especiais terão de ser revistos. Uma coisa é dar o benefício a quem trabalha em usinas de carvão. É um número pequeno de pessoas. Mas, quando isso se aplica a um contingente grande, o ônus fiscal passa a ser enorme. Ainda há o agravante da longevidade no RS – avalia o economista Fábio Giambiagi.

O governador Tarso Genro, em sua gestão, deu o primeiro passo aumentando a alíquota de previdência dos servidores de 11% para 13,25%, no limite do que o Judiciário considera confisco. Ele ainda criou o FundoPrev, que separou os novos servidores dos antigos.

Quem é contratado agora, contribui apenas para o FundoPrev, que ficará por anos acumulando recursos. A medida deve gerar resultados a partir de 2027, quando o pagamento de aposentadoria aos servidores antigos começará a reduzir, fazendo minguar, aos poucos, o déficit bilionário.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

GOLDENBERG DEFENDE UM NOVO PACTO SÓCIO-POLÍTICO

JORNAL DO COMERCIO 06/08/2014

Rubens Goldenberg defende um novo pacto sócio-político


Eduardo Amaral


JONATHAN HECKLER/JC
Rubens Goldenberg defende um novo pacto sócio-político
Rubens Goldenberg defende um novo pacto sócio-político
Aos 58 anos, o empresário Rubens Goldenberg (PRP) entra na disputa ao Senado sabendo das dificuldades que terá para colocar-se como uma alternativa viável para os eleitores. O grande desafio de Goldenberg será apresentar suas propostas e angariar votos para uma legenda ainda pequena no Estado. “Posso fazer muito mais que muita gente imagina”, projeta.

Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o candidato defende uma Constituinte exclusiva e mudanças profundas na legislação brasileira. Para Goldenberg, o País só conseguirá avançar com “um novo pacto sócio-político”. O candidato do PRP prega a independência e critica a atuação dos parlamentares da base aliada. Goldenberg entende que fazer parte do governo não implica “ser lacaio do governo”, atitude adotada, segundo ele, por deputados e senadores da base da presidente Dilma Rousseff (PT).

Jornal do Comércio - O que o senhor pode acrescentar como senador da República pelo Rio Grande do Sul?

Rubens Goldenberg –
 Posso fazer muito mais que muita gente imagina, porque eu não tenho vinculação nenhuma ao governo estadual nem federal, eu não devo favor, eu não tenho cargo indicado, meu partido não tem cargo. Nós vamos livres para poder defender o ser humano, o povo. Os outros têm cargo, têm ministério, ocupam espaço e, quando se ocupa espaço, você tem obrigações, e o senador tem que ter liberdade de ação.

JC - Mas essa liberdade partidária não pode ser uma faca de dois gumes em um cenário político que cada vez mais se precisa de parceria e união em blocos para as votações?

Goldenberg – 
É um pouquinho diferente, tu colocas que vivemos em um presidencialismo participativo, não é participativo. Vivemos em um presidencialismo não de participação, mas de coabitação. A conversa deve existir em qualquer instância, fazendo parte do governo ou não. O que tem que ser discutido é o pacto social político e federativo. Não existe uma federação aqui, existe um império. A União arrecada, fica com 64%, o resto divide entre estados e municípios. Fazer parte do governo é muito fácil, pois estás no bolo, quando o bolo é um só, aqueles que fazem parte dividem o bolo, mas não têm o direito e a liberdade de tentar fazer com que o bolo seja mais justo. Mas fazer parte do governo é não ser lacaio do governo.

JC - Qual a sua proposta para a dívida do Estado?

Goldenberg –
 Passa por uma auditoria e, acima de tudo, vontade política para resolver. A Lei Kandir, que beneficiaria o Rio Grande do Sul em milhões, nunca foi regulamentada, desde o governo FHC (Fernando Henrique Cardoso, PSDB) até agora, nunca regulamentou, os outros vão dizer agora que vão regulamentar. Agora vão dizer que baixar os juros da dívida vai resolver o problema do Estado. O Estado passa por uma questão de reestruturação de dívida, por uma questão de gestão, passa por questão política. As pessoas precisam diferenciar o que é Estado do que é governo. Governo é uma coisa transitória, o Estado permanece. As coisas têm que ser projetadas para 10, 20 anos. Enquanto não houver o pacto sócio-político, não há mudança em nada.

JC - O pacto social é a sua principal bandeira?

Goldenberg –
 Um pacto social e político, porque sem mudança política, da forma como está, no voto proporcional, vence quem tem a capacidade econômica maior. Você é candidato lá de Soledade, faz 50 mil votos em Soledade, vai ao Interior e pega mais 40 municípios e faz mil votos, qual o compromisso que você tem com esses votos, nenhum. Já no voto distrital, você é eleito pelo seu distrito.

JC - O senhor defende uma nova Constituinte. Para que matérias?

Goldenberg –
 Defendo uma Constituinte exclusiva para reformarmos tudo o que estamos discutindo: dívida, saúde, educação. Reforma constitucional seria para reformular o Estado, não os entes federados. Essa Constituinte vai delinear as necessidades reais do povo, as necessidades reais dos municípios. Não adianta delegar para o município se ele não tem recurso.

JC - A eleição para o Senado tem se mostrado polarizada entre dois candidatos, Lasier Martins (PDT) e Olívio Dutra (PT). Como pretende entrar nessa disputa?

Goldenberg –
 Não vamos quebrar a polarização atacando quem quer que seja. Nós vamos mostrar e terminar com a polarização mostrando a verdade. Quando você vai para a função pública, você representa o povo, não é você, então, você tem que dizer a verdade. Saúde, por exemplo. Mais Médicos, eu sou a favor do Mais Médicos, mas sou a favor do Mais Médicos brasileiro, criando a carreira federal de médico, com concurso e com regramento. Na saúde, o primeiro projeto de lei seria determinar que todos os cargos eletivos, presidente da República, vice-presidente, senador, deputados estaduais, deputados federais, todos eletivos são obrigados a usar o SUS. Se você é o gestor público e não serve para você e o povo tem que passar a miséria na fila, sem remédio e sem equipamento, bota o gestor público a passar na própria pele o que está passando o povo. Ele tinha que por moral e por obrigação usar o serviço público e dar exemplo. As minhas principais bandeiras são saúde, educação e segurança e a renegociação da dívida pública.

JC - E quais as propostas para a segurança?

Goldenberg -
 Proposta um: readequar os contingentes das polícias militar e civil. Dois: prepará-los efetivamente com cursos, não de seis meses nem de um ano, mas de pelo menos dois anos. Três: salários dignos para que exerçam a função e não precisem de bicos. Quatro: o aparelhamento científico do Estado. Quinto: aparelhamento em diligência. Você não lida com o crime de tráfico da mesma forma que o praticado pelo cidadão que rouba biscoito.

JC - Entre suas propostas está o ensino religioso, a critério das escolas e dos alunos. Como seria?

Goldenberg –
 A cultura religiosa é uma cadeira em que você não discute uma religião, você ensina a cultura de todas as religiões. E se ele quiser amanhã optar por uma delas, ele vai optar. Isso é implementar algo no ser humano que ele vai aprender que existe Deus, que existe algo superior independentemente de religião.

Perfil

O candidato ao Senado pelo PRP, Rubens Goldenberg, nasceu em Santo André, São Paulo, durante uma viagem de negócios da família. Dias depois, já estava em Rio Grande, onde passou boa parte de sua vida. Em 2008, foi candidato a prefeito de Rio Grande pelo DEM. Segundo o candidato, o objetivo, na época, era apresentar-se aos eleitores locais, depois de muitos anos fora da cidade. Com isso, visava às eleições municipais de 2012, porém, em razão da descoberta de um linfoma, adiou os planos para realizar o tratamento. Casado e pai de três filhos, Goldenberg vive atualmente em Porto Alegre, cidade onde presta consultoria para empresas privadas. No Senado, se propõe a defender reformas tributárias e constitucionais.

CIRO QUER REFORMAS ELEITORAIS E ADMINISTRATIVA

JORNAL DO COMERCIO 13/08/2014

Reformas eleitoral e administrativa são inadiáveis, afirma Ciro Machado


Marcus Meneghetti

ANTONIO PAZ/JC
Candidato do PMN acredita que o País precisa das reformas eleitoral, política e administrativa
Candidato do PMN acredita que o País precisa das reformas eleitoral, política e administrativa
O candidato a senador pelo PMN, Ciro Machado, acredita que o País precisa urgentemente das reformas eleitoral, política e administrativa. Suas principais propostas sugerem alterações no processo das eleições, nas práticas políticas e nos gastos com a administração pública – o que requer mudanças na Constituição, que, como o próprio candidato reconhece, são difíceis de serem realizadas. Ao avaliar a reforma política e eleitoral formulada pelo governo federal, classifica-as como “superficiais, apenas perfumaria, que não vão gerar mudanças profundas”. Além disso, julga que nenhuma das outras candidaturas ao Senado apresenta possibilidades de mudanças significativas nessas matérias.

Como suas propostas têm caráter nacional, o candidato do PMN pensa que o espaço adequado para divulgação das suas ideias é o Senado. Ele sustenta que sua candidatura é federal, não regional, embora acredite que as reformas que defende teriam efeitos nos estados e municípios.

Machado avalia ainda que nenhum dos dois candidatos que lideram as pesquisas de intenção de voto – o comunicador Lasier Martins (PDT) e o ex-governador Olívio Dutra (PT) – têm propostas concretas, além de os partidos de ambos defenderem a reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT), a quem ele faz oposição, seguindo a orientação do seu partido, que declarou que fará campanha para o presidenciável Aécio Neves (PSDB). 

Jornal do Comércio – O senhor é a favor de uma reforma política?

Ciro Machado – 
Sem as reformas política, eleitoral e administrativa, o Brasil não tem futuro. Na reforma eleitoral, prego um limite legal para a criação de novos partidos. O PSD, criado pelo (ex-prefeito de São Paulo Gilberto) Kassab, é um exemplo clássico: de repente, não estavam sendo atendidos nos seus cargos e resolveram criar um partido a partir dos deputados eleitos por outra legenda. Ou seja, a Lei Eleitoral é omissa à infidelidade partidária. Então, se isso não tiver um limite na Lei Eleitoral, em breve, ao invés de 32 partidos, vamos ter 64. Portanto, defendo limites legais para a criação de novos partidos. Além disso, sou a favor da verticalização das coligações: tem que terminar com essas coligações espúrias, esdrúxulas, interesseiras que são realizadas nos estados, em contradição às nacionais. Aqui, no Rio Grande do Sul, muitos candidatos ao Senado estão coligados na chapa da presidente Dilma em nível nacional e descoligados em nível estadual. Isso aí confunde a cabeça dos eleitores, não é uma boa prática política, enfraquece os partidos. Aí, aparece o candidato Lasier dizendo que o PDT do Rio Grande do Sul é diferente do PDT Nacional. Eles se justificam dizendo que são diferentes, mas não existe diferença, porque não existe o partido regional, ele é nacional.

JC – Falta coerência?

Machado –
 Coerência partidária. Existe uma assembleia nacional do partido, com todas as instâncias e, se decidem apoiar determinado candidato, ele tem que seguir aquela orientação. Sem espaço para dissidência. Também é necessário a unificação das eleições em todos os níveis, já a partir de 2018, desde o prefeito ao presidente da República. Essa medida evitaria, por exemplo, que metade dos vereadores de Porto Alegre em pleno exercício do mandato sejam candidatos a deputado, sem se licenciarem da Câmara Municipal. Se analisarmos o caso da senadora Ana Amélia Lemos (PP), ela não tem nada a perder, pois, seu mandado no Senado está garantido. Se ela estivesse no final do mandato de senadora, tenho quase certeza que pensaria duas vezes antes de se candidatar a governadora. Além disso, proponho a perda do mandato para o parlamentar que assumir cargo no Executivo e a ampliação do prazo para desincompatibilização para vice-governadores e vice-prefeitos de seis meses para um ano. Por último, defendo a inelegibilidade dos candidatos condenados já na primeira instância.

JC – E quanto ao financiamento das campanhas?

Machado –
 Minha proposta é que financiamento seja feito apenas pela iniciativa privada, através somente de pessoas físicas, na razão de 10% dos seus rendimentos anuais declarados à Receita Federal. Esse limite significa que a pessoa está interessada em ajudar o candidato, não em financiar o candidato para obter retorno depois.

JC – As propostas que o senhor mencionou até agora entrariam em uma reforma eleitoral, mas o senhor também mencionou uma reforma política. Que tipo de mudanças o senhor propõe?

Machado -
 O meu principal item é reduzir pela metade o número de deputados federais e em um terço o de senadores. Como não se pode reduzir salário, tem que reduzir o número de cadeiras. Isso é possível através de uma proposta de emenda constitucional para alterar o artigo 45, parágrafo primeiro da Constituição. Hoje, os 513 deputados mais os 81 senadores custam, segundo o portal Transparência Brasil, R$ 8,5 bilhões por ano. Se reduzir o quadro pela metade, vai haver uma economia de R$ 4,2 bilhões anuais. Além da economia bastante significativa, teremos um Congresso mais qualificado e de fácil controle por parte do eleitor. Também prego o fim das emendas parlamentares, porque, o parlamento tem que legislar, fiscalizar o Executivo e analisar o orçamento. Além disso, as emendas deixam o parlamentar dependente do Executivo, corrompem o parlamento, não lhe dão liberdade. Cada parlamentar tem direito a R$ 500 milhões por ano em emendas, o que representa o total de R$ 7 bilhões por ano, ou seja, 1% do orçamento da União.

JC – E a reforma administrativa?

Machado –
 Precisamos reduzir o número de CCs (cargos em comissão) e de ministérios. Creio que teríamos que reduzir os ministérios pela metade, pois, 39 ministérios é demais. Também teríamos que reduzir o número de CCs, em nível federal. O Executivo abriga 22.600 CCs, o que representam um gasto de R$ 4 bilhões por ano. E o Congresso gasta muito mais: são 4.050 CCs no Senado e 12.825 na Câmara dos deputados, somando um total de 16.875 CCs, que custam R$ 6 bilhões anuais. Então, reduzindo deputados e senadores, teríamos uma economia de R$ 4,2 bilhões por ano, acabando com as emendas parlamentares, economizaríamos R$ 7 bilhões anuais e reduzindo pela metade os CCs, deixaríamos de gastar mais R$ 5 bilhões. Ou seja, com minhas as propostas, o País teria uma economia de R$ 16 bilhões por ano. Esse valor equivale ao orçamento de vários ministérios e de alguns estados.  Além disso, proponho concurso público para conselheiros e ministros dos tribunais de Contas. Acho que tem que ser abolida a interferência do Executivo na nomeação.

Perfil

Jornalista e advogado, Ciro Machado começou a trajetória política no Sindicato dos Radialistas, onde foi presidente duas vezes e militou durante as décadas de 1980 e 1990. Em 2004, quando era filiado ao PSC, foi candidato a vice-prefeito de Porto Alegre, na chapa encabeçada pelo deputado federal Beto Albuquerque (PSB) – que hoje é um dos adversários na disputa por uma cadeira no Senado. No mesmo ano do pleito, filiou-se ao PSB, onde tentou uma candidatura ao Senado. Mas, nas suas palavras, “não conseguiu espaço para divulgar as suas ideias dentro da legenda”. Por isso, no final de 2012, aceitou o convite para reorganizar o PMN.  

LASIER É A FAVOR DA UNIFICAÇÃO DO ICMS

JORNAL DO COMERCIO 18/08/2014

Lasier é a favor da unificação da alíquota do ICMS


Lívia Araújo

ANTONIO PAZ/JC
Lasier comenta ao JC sobre a candidatura ao Senado
Lasier comenta ao JC sobre a candidatura ao Senado
Profissional de mídia há cinco décadas, o pedetista Lasier Martins entrou para a política partidária no ano passado, quando deixou o grupo RBS para se filiar ao PDT, pelo qual se lançou, em sua primeira disputa eleitoral, candidato ao Senado. A forte presença midiática, a seu ver, representa mais um desafio do que uma vantagem na campanha. “Eu tenho andado muito pelo Estado, e o que mais tenho ouvido é ‘vamos ver se você vai lá para cima para ser igual aos outros’. Mas a exposição pode me dar uma pequena vantagem, se as pessoas que concordam com o que eu pregava no rádio e na televisão votarem em mim”, acredita.

Lasier conta que aceitou concorrer com a condição de que o PDT fosse à disputa com candidato próprio. “O PDT não pode servir de coadjuvante de outros partidos, ele tem que ser protagonista”, acredita. Sua principal plataforma de campanha é relativa às finanças do Estado. Lasier defende que a escassez de recursos poderá ser sanada com um novo pacto federativo que reveja a centralização de tributos estaduais na União. “Temos de reivindicar um melhor atendimento tributário, mas também fazer uma unificação da alíquota do ICMS”, avalia. 

Integrando a chapa majoritária encabeçada por Vieira da Cunha (PDT) e Flávio Gomes (PSC), em coligação com DEM, PV e PEN, o candidato, nesta entrevista ao Jornal do Comércio, também comenta sobre os desdobramentos das jornadas de junho e critica as políticas de Estado de um de seus principais adversários ao Senado, o petista Olívio Dutra.

Jornal do Comércio – Como se deu sua aproximação com a política e o que o motivou a concorrer ao Senado?

Lasier Martins –
 Há 30 anos eu tenho sido convidado a entrar na política. O PP, o PSDB e o PMDB também me chamaram para concorrer ao Senado. Sempre protelei, mas, com o crescimento da degradação da política, aquilo começou a me soar como um desafio e eu achei que realmente estava na hora de fazer o que tanto me inquietava. Aceitei com a condição de que o PDT tivesse candidatura própria e, daqui por diante, tenha candidato em todas as eleições, empenhando-se para não mais viver a reboque de outros partidos. É um partido com a cara do gaúcho, e meu pai sempre foi um fervoroso trabalhista. Por esses fatores todos eu decidi colocar meu nome à disposição.

JC – Quais são os temas centrais da sua candidatura e prioridades para o Senado?

Lasier – 
Eu entendo que nada se fará pelo Rio Grande do Sul sem uma mudança orçamentária. O ponto de partida é mexer no pacto federativo. A Constituição diz que estados e municípios têm autonomia, mas não é possível isso acontecer sem recursos. Existe uma grande concentração de tributos na União e, cada vez mais, os estados perdem poder, têm mais compromissos, mas menos recursos. O Rio Grande do Sul é o 6º estado em arrecadação, mas é o 11º em retorno. São R$ 35 bilhões que mandamos para Brasília e em troca recebemos R$ 12 bilhões. A Bahia arrecada só R$ 15 bilhões e recebe de volta R$ 25 bilhões, quase o dobro. Há uma falta de equanimidade no tratamento. Temos de reivindicar um melhor atendimento tributário, mas também fazer uma unificação da alíquota do ICMS. A pedra de toque para o desenvolvimento é a questão financeira. Todo mundo fala que precisamos melhorar a educação, a segurança, a agricultura, a saúde, mas isso tudo é muito vazio se não tivermos mudanças com relação à distribuição dos tributos, entre eles, o Fundo de Participação dos Municípios. O governo central distribui conforme suas conveniências ou simpatias partidárias, e nossos municípios gaúchos têm recebido muito pouco. Então, é preciso mexer na questão tributária através do reestabelecimento do pacto federativo.

JC – O senhor critica fortemente a saída da Ford do Estado, no governo de Olívio Dutra. Mas a empresa acabou sendo condenada pela Justiça a indenizar o Estado...

Lasier 
 Esse caso não terminou ainda. Quando o governo (Antonio) Britto (PMDB) trouxe a Ford para o Rio Grande do Sul, a empresa adquiriu, através do governo e com grande participação financeira deste, os terrenos de Guaíba. E antecipou, na época, R$ 300 milhões, que hoje vão a muito mais de R$ 1 bilhão, que seriam usados na construção da infraestrutura. É desse dinheiro que o governo do PT foi atrás e ganhou, mas esta ação não terminou. Esse processo ainda pende de julgamento pelo pleno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A Ford, por uma questão de marketing, não quis entrar contra o governo do Rio Grande do Sul por quebra de contrato. A empresa gastou muito para fazer o projeto de instalação no Rio Grande do Sul, contratou consultorias, fez projeto de quais automóveis seriam montados aqui, e isso demandou gastos e contrato. Mas, quando o Olívio assumiu, declarou que não daria dinheiro para multinacional rica. Ele quebrou o contrato a tal ponto que, quando o presidente da Ford, Ivan Pereira, veio ao Rio Grande do Sul, o Olívio não o recebeu, deu-lhe um chá de banco e o mandou ser recebido pelo Zeca Moraes (então secretário estadual de Desenvolvimento e Assuntos Internacionais, PT). Sei disso porque, na época, eu estava na reportagem e acompanhei tudo, além de ter ido a Detroit (EUA), quando uma comitiva de empresários e deputados do governo Britto foi lá agradecer ao presidente mundial da Ford por ter escolhido o Rio Grande do Sul. Jack Nasser disse: “Vamos fazer em Guaíba a fábrica de automóveis mais moderna do mundo, porque o automóvel sempre existirá, a diferença é que serão mais sofisticados”. E confirmou, diante de nós, que viria à inauguração e transformaria Guaíba na cidade mais ajardinada do Rio Grande do Sul. Na semana seguinte, se soube que a Ford não vinha mais por quebra de contrato. Isso foi uma decisão altamente prejudicial à economia do Estado, porque ao não vir a Ford, também não vieram a Goodyear e outras empresas. Na Bahia, houve a criação de milhares de empregos, renda, tributos. Alguém poderá dizer que “o Lasier está aferrado a uma questão do passado”. Sim, a questão é do passado, mas as consequências estamos vivendo hoje.

JC – O público vê uma polarização entre o senhor e Olívio Dutra, muito por conta de sua postura em relação à Ford.

Lasier –
 Temos divergências muito profundas em questão de desenvolvimento econômico. O Olívio recebeu um governo e o entregou pior ao seu sucessor. Reconheço que ele é uma pessoa honesta, um homem íntegro, mas tem decisões muito desastradas. Ele está muito aferrado a uma política estatizante, à agricultura familiar, que é importante, principalmente, para nós gaúchos, mas só isso não resolve. Temos que avançar e dar alguns passos adiante, em sintonia com o mundo moderno, e o Olívio não acompanha isso. Os grandes investimentos que perdemos são uma triste herança que temos: o Rio Grande do Sul está desprezado, porque criou-se um preconceito de que o Estado não cumpre contratos.

JC – O PSB, que está apoiando José Ivo Sartori (PMDB), e o PDT, há menos de um ano, apoiavam o governo Tarso Genro (PT). O que explica essa mudança?

Lasier  –
 O PDT entrou no governo Tarso contra a vontade do presidente estadual do partido, Romildo Bolzan, e do hoje candidato a governador Vieira da Cunha, além de vários candidatos a deputado federal, entre eles Pompeo de Mattos. Mas, como houve uma decisão de diretório estadual por pequena margem, os principais dirigentes perderam e aí alguns pedetistas entraram no governo. Mas quando obtivemos, junto ao presidente nacional do PDT (Carlos Lupi), a liberação para lançarmos candidatura própria, esses principais aderentes do governo Tarso se desligaram e aceitaram a posição de autonomia do PDT. Eu entendo o PDT como um partido muito grande. Não tem nada que servir de coadjuvante de outros partidos, tem que ser protagonista.

JC – O PDT apoia Dilma Rousseff (PT) em nível nacional. Qual a sua posição?

Lasier –
 Eu não apoio a Dilma, porque acho que ela não atendeu bem às carências do Rio Grande do Sul. Há quatro anos e meio eu a entrevistei, perguntando se faria a ponte do Guaíba e ela disse que sim, mas o governo dela está terminando e a ponte não tem licenciamento, nem projeto. Ela não cumpriu a promessa da ponte do Guaíba e agora promete o metrô, que é um sonho que temos, mas é irrealizável em curto e médio prazo. Ela também não cumpre o pacto federativo; pelo contrário, deixa os municípios gaúchos e estados como o Rio Grande do Sul à mingua.

JC – Como avalia a sequência dos protestos de 2013?

Lasier –
 Olha, foi uma das coisas mais emocionantes que vi. Aqueles acontecimentos também determinaram minha decisão de concorrer, pois percebi que a sociedade brasileira, as pessoas de bem estavam começando a reagir, saindo da letargia e protestando. É uma pena que, nos políticos brasileiros, aquilo entrou por um ouvido e saiu pelo outro. O povo brasileiro quer melhores serviços públicos, ética na política, o fim do esbanjamento do dinheiro público, do excesso de ministérios, dos 22 mil cargos de confiança (CCs), do aparelhamento do Estado por um partido único, nada disso a população quer.

JC – Há alguma maneira de a população participar das mudanças, além das eleições? O que acha dos conselhos propostos por Dilma?

Lasier –
 Esses conselhos populares do decreto da presidente são, antes de mais nada, inconstitucionais. Não resistem a uma avaliação do poder Judiciário. Mas acho que nós tivemos um início de reação. A população percebeu que somos um País rico, temos muitos recursos, solo fértil; temos biodiversidade para produtos farmacêuticos e médicos que nenhum outro país tem, recursos minerais, temos o pré-sal e, no entanto, apesar de sermos a sétima economia do mundo, estamos no 80º lugar no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), um absurdo. A população se deu conta que é mal administrada, então, está na hora de reagir. Espero que essa reação se converta em votos, em gente nova na política.

JC – Acha que, de alguma forma, a população deve participar de políticas de governo?

Lasier –
 Acho que pode, por meio das leis populares, mas nós não podemos perder o sistema representativo. Ainda é o Congresso Nacional e os Parlamentos estaduais que devem responder, embora não estejam respondendo. Isso pode demorar um pouco, mas nós temos que começar a combater essas más políticas, através dessa representatividade parlamentar.

JC – Com relação à crise da política representativa, uma das questões discutidas é o fim do financiamento privado de campanhas. O que pensa?

Lasier –
 Nós precisamos de uma reforma política. A ideia de que não existe almoço grátis obriga os eleitos e beneficiários destas vultosas contribuições a retribuir as doações. Temos de encontrar um meio termo em relação à captação de recursos junto à iniciativa privada. Do jeito que está não dá. Mas o financiamento público também é injusto, pois não temos recursos para as carências essenciais da vida brasileira. Além do mais, o que impedirá que clandestinamente haja contribuições para os candidatos que estiverem mais afeiçoados na defesa dos grandes interesses privados?

JC – Como se poderia encontrar esse meio termo?

Lasier –
 Acho que tem que diminuir o tamanho das ofertas, estabelecer um limite. Nenhum candidato pode receber mais do que um valor “x”, reunidos todos os doadores. É inadmissível, como estamos vendo agora, a presidente Dilma recebendo bilhões, é a que mais está recebendo. Aqui no Estado, o candidato à reeleição é o que mais recebe. Os partidos pequenos não recebem praticamente nada, então, se for estabelecido um teto, iguala um pouco mais.

JC – Isso garante que não vai haver retribuição?

Lasier –
 Acho que não, porque estabelecendo limites o candidato vai perceber que ele não tem grande obrigação, porque se o empresário doar R$ 300 mil no máximo, isso não vai significar obrigação. Para fins de uma eleição, isso é pouco significativo. Da mesma maneira que também não concordo com a lista fechada, que é voltar ao voto de cabresto, pois as cúpulas decidem quais candidatos devem ser colocados na ponta da lista.

JC – O que acha da regulação da mídia?

Lasier –
 Há por trás disso a ideia de limitar a liberdade de imprensa. Acho um atraso. Sobre alguns órgãos serem mais poderosos do que outros, é porque são mais competentes. Vivemos em uma economia de mercado, então, há alguns veículos que pagam melhores salários, espalham mais sucursais e emissoras. Isso é competência.

Perfil

Lasier Costa Martins nasceu no município de General Câmara, em 1942. Aos 16 anos de idade, iniciou sua trajetória no rádio, em Montenegro, e fez carreira na imprensa gaúcha. Já instalado em Porto Alegre, ingressou na equipe de esportes da rádio Difusora, aos 17 anos. A partir de 1961, trabalhou na rádio Guaíba, onde permaneceu por 24 anos. Em 1986, deixou o veículo para entrar no grupo RBS, no qual atuou como âncora de telejornal, comentarista e apresentador, com participação na RBSTV e na rádio Gaúcha. Sua entrada na política ocorreu em outubro do ano passado, quando se desligou da RBS para se filiar ao Partido Democrático Trabalhista (PDT), pelo qual se lançou candidato ao Senado Federal, na chapa majoritária composta por Vieira da Cunha (PDT) e Flávio Gomes (PSC). Lasier também é advogado, formado em Direito pela Ufrgs. Exerceu a profissão por 20 anos, mas deixou de advogar para dedicar-se exclusivamente ao jornalismo. 

JULIO FLORES DEFENDE UMA ALTERNATIVA DE ESQUERDA PARA O BRASIL

Jornal do Comércio 20/08/2014

Para Julio Flores, Brasil precisa de uma alternativa de esquerda


Eduardo Amaral

GILMAR LUÍS/JC
Julio Flores defende que o Brasil precisa de uma alternativa de esquerda
Julio Flores defende que o Brasil precisa de uma alternativa de esquerda
Candidato ao Senado pelo Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), Julio Flores defende que o Brasil precisa de uma alternativa de esquerda. Forte crítico dos governos dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff e da gestão do tucano Fernando Henrique Cardoso, o político mantém, após mais de 30 anos de militância, o discurso do começo da vida política, em 1979.

Em 2014, vai para sua décima eleição, tendo concorrido a diversos cargos sem ter sido eleito. Em 2004, quando concorreu a vereador de Porto Alegre, chegou a receber mais votos que concorrentes eleitos, porém, em razão da cláusula de barreira, não assumiu.

Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Julio Flores critica a polarização existente entre representantes da direita e o PT, que se coloca, segundo ele, como sendo de esquerda. Para o candidato, os dois partidos representam o mesmo projeto.

Jornal do Comércio - O que as candidaturas do PSTU trazem de diferente para o cenário eleitoral?

Julio Flores –
 Nós achamos que a nossa Frente de Esquerda (coligação entre PSTU e P-Sol no Estado), o PSTU em particular, é o que faz a diferença. Porque todos os demais partidos de uma maneira ou de outra já governaram o Estado e o País, e governaram pros ricos sempre. E a nossa proposta é justamente que a gente tenha um governo a nível nacional, um governo dos trabalhadores, que rompa com a lógica de dominação sobre o povo, que tem sido os governos tanto PSDB, com Fernando Henrique, como de Lula e Dilma. São governos que efetivamente têm governado para os ricos, o próprio Lula não cansa de alardear que nunca os banqueiros e os empresários ganharam tanto quanto sob os governos do PT. Todo aquele propósito inicial de um governo dos trabalhadores, de governar para o povo, tem sido objetivamente desmentido por parte do próprio PT. Faz 12 anos que eles estão governando o país e o que a gente observa é que eles tem governado pros ricos. A diferença é que nós, do PSTU, agora em aliança com o P-Sol, aqui no Rio Grande do Sul, temos o propósito de fazer esse debate. O debate de que é necessário romper com essas amarras e estabelecidas pelo capital internacional e fazer mudanças profundas, porque é a única maneira de resolver o problema da miséria, da fome, do analfabetismo, da opressão às mulheres, aos negros, aos homossexuais.

JC - A disputa para o Senado, até o momento, está polarizada entre Olívio Dutra (PT) e Lasier Martins (PDT). Como o PSTU entra nesse embate?

Julio Flores –
 Do mesmo modo que tem essa falsa polarização entre Ana Amélia (PP) e Tarso (PT), tem também no senado uma outra polarização. E veja você que a RBS tem importância nas duas disputas, Ana Amélia foi funcionária da RBS durante anos e o Lasier Martins (PDT) também. A RBS está nesse disputa e o PT está nessa disputa. Então há uma disputa que do meu ponto de vista é uma falsa polarização, porque uns entendem que o PT é esquerda e a RBS, com a Ana Amélia e o Lasier Martins são a direita. E de fato isso não existe, eles têm o mesmo programa.

JC - Há quatro anos, se elegeram os senadores Ana Amélia (PP) e Paulo Paim (PT). O P-Sol, que está coligado com o PSTU, concorria, mas, em dado momento da campanha, para diminuir a ameaça da candidatura de Germano Rigotto (PMDB) a Paim, que tentava a reeleição, o P-Sol optou por se retirar e apoiar o petista. Isso pode acontecer agora?

Julio Flores –
 Eu acho que, em primeiro lugar, a decisão do P-Sol foi errada na época. Eles tomaram uma decisão de apoiar o Paim. Mas o Paim, apesar de parecer ser um sujeito que defende a aposentadoria, os aposentados, de fato, ele reforça todo esse governo que o PT tem desenvolvido nos anos todos. Então, foi errada a decisão, tanto é que não só nós entendemos isso como vários companheiros da frente que apoiavam o Olívio, apoiavam o PT, votaram na nossa companheira Vera Guasso significativamente naquela ocasião. Dentro do P-Sol, inclusive, e dentro da própria Frente Popular, vários companheiros se posicionaram favoravelmente a nossa candidatura ao Senado. Hoje, não creio que seja igual, mas é parecido, e essa coisa do voto útil. E isso interessa ao próprio PT e à Frente Popular, polarizar com a direita para que o PT possa se favorecer. O projeto de todos eles é resolver o problema dentro do regime atual, passar por dentro do processo de dominação do capital sobre o trabalho a partir das instâncias superiores, a Câmara Federal, o Senado, a presidência da República, o governo do Estado. Então eles não propõem nenhuma mudança substancial.

JC - Como está a relação com o P-Sol?

Julio Flores –
 Felizmente, nós conseguimos aqui com o (candidato a governador Roberto) Robaina (P-Sol) e comigo, ao Senado, uma coligação completa, estabelecer um programa mínimo de oposição ao governo, porque nós não queremos nem que a direita volte e nem que a Frente Popular siga. Nós queremos ser a terceira, a opção nesses dois campos de polarização que eles estão colocando com Ana Amélia e Tarso, Lasier (Martins, PDT) e Olívio. A verdadeira esquerda, tanto que meu lema para o Senado é: “Esquerda de verdade”.

JC – Não é a sua primeira eleição, não teme, em algum momento, se tornar um personagem folclórico?

Julio Flores –
 Não, pelo contrário, essa firmeza de ideias que o PSTU tem é uma virtude nossa. O que pode virar folclore é o fato de as pessoas verificarem que o Lula não é mais de esquerda, isso é uma piada. Porque quando o sujeito governou o País, foi eleito, fez alianças com Deus e Diabo. Aí eu pergunto, foi para isso que a gente elegeu o Lula? Não foi. Foi para mudar a vida das pessoas, acabar com a miséria, acabar com a exploração, com a acumulação de capital e a concentração de terras. Então,isso vai virar folclore, porque a origem do PT foi justamente o contrário. Hoje, ele está dizendo que o burguês não tem do que se queixar. Isso é ridículo, isso engendra folclore. Isso é uma piada. O PSTU só está resgatando aquilo que foi o propósito do inicial do PT e da CUT. O nosso propósito é fazer uma revolução social, é mudar a estrutura social do País.

JC – A crítica ao PT não pode se repetir em relação ao PSTU quando este chegar ao poder?

Julio Flores –
 Não há nenhuma garantia, a única garantia que existe é, primeiro, as nossas convicções. Mas também a nossa história, para teres uma ideia, nós rompemos com o PT em 1992, nós éramos favoráveis a levar às ruas a campanha pelo Fora (Fernando) Collor, e o José Dirceu (PT) foi o cara que operou toda a expulsão da Convergência Socialista (antiga corrente do PT que deu origem ao PSTU) que na época defendia o Fora Collor, e eles eram contra. Não há vacina para isso, a única vacina é a convicção e a relação objetiva que a gente estabelece com todas as organizações. Por exemplo, o principal mecanismo de cooptação existente hoje são os salários dos deputados, senadores e vereadores. E para nós o salário de um deputado nosso, como a nossa companheira Amanda (Grurgel, vereadora em Natal) e do Cleber (Rabeleo, vereador em Belém) são vereadores nossos, mas eles não ganham mais do que ganhavam antes de serem eleitos. Eles ganham o salário de origem. Em contrapartida, mesmo que o deputado ganhe R$ 20 R$ 30 mil, o resto vai para o fundo do partido para apoiar as lutas dos trabalhadores. Então, o mandato não é um privilégio.

JC – Como explicar para a população essa destinação de parte do salário para um fundo partidário?

Julio Flores –
 Eu acho que é simples, não tem muito drama nisso. Ao invés de o salário enriquecer o parlamentar, vai para o fundo para ajudar a luta dos trabalhadores. Então, isso tem simplicidade, não tem muito o que questionar, porque esse é o nosso propósito. Se tem uma greve, tem uma ocupação, tem uma luta, o PSTU não vai titubear no que vai fazer com esse dinheiro. Isso não vai para enriquecer as pessoas, o partido, ela vai estar em serviço da construção do próprio partido, mas principalmente no fortalecimento da luta do povo.

Perfil

Professor de matemática, Julio Flores tem 55 anos, nasceu em São Borja e iniciou a militância no movimento estudantil em 1979. Militante do PSTU desde a sua fundação, também participou da fundação do PT, partido do qual foi expulso em 1992. Nas eleições estaduais, concorreu a governador em 2002 e 2010. Em 2014, concorrerá ao Senado pela segunda vez. Em 1998, fez pouco mais de 24 mil votos, quando estreou na disputa pela vaga ao Senado.