ANTONIO PAZ/JC
Lasier comenta ao JC sobre a candidatura ao Senado
Profissional de mídia há cinco décadas, o pedetista Lasier Martins entrou para a política partidária no ano passado, quando deixou o grupo RBS para se filiar ao PDT, pelo qual se lançou, em sua primeira disputa eleitoral, candidato ao Senado. A forte presença midiática, a seu ver, representa mais um desafio do que uma vantagem na campanha. “Eu tenho andado muito pelo Estado, e o que mais tenho ouvido é ‘vamos ver se você vai lá para cima para ser igual aos outros’. Mas a exposição pode me dar uma pequena vantagem, se as pessoas que concordam com o que eu pregava no rádio e na televisão votarem em mim”, acredita.
Lasier conta que aceitou concorrer com a condição de que o PDT fosse à disputa com candidato próprio. “O PDT não pode servir de coadjuvante de outros partidos, ele tem que ser protagonista”, acredita. Sua principal plataforma de campanha é relativa às finanças do Estado. Lasier defende que a escassez de recursos poderá ser sanada com um novo pacto federativo que reveja a centralização de tributos estaduais na União. “Temos de reivindicar um melhor atendimento tributário, mas também fazer uma unificação da alíquota do ICMS”, avalia.
Integrando a chapa majoritária encabeçada por Vieira da Cunha (PDT) e Flávio Gomes (PSC), em coligação com DEM, PV e PEN, o candidato, nesta entrevista ao Jornal do Comércio, também comenta sobre os desdobramentos das jornadas de junho e critica as políticas de Estado de um de seus principais adversários ao Senado, o petista Olívio Dutra.
Jornal do Comércio – Como se deu sua aproximação com a política e o que o motivou a concorrer ao Senado?
Lasier Martins – Há 30 anos eu tenho sido convidado a entrar na política. O PP, o PSDB e o PMDB também me chamaram para concorrer ao Senado. Sempre protelei, mas, com o crescimento da degradação da política, aquilo começou a me soar como um desafio e eu achei que realmente estava na hora de fazer o que tanto me inquietava. Aceitei com a condição de que o PDT tivesse candidatura própria e, daqui por diante, tenha candidato em todas as eleições, empenhando-se para não mais viver a reboque de outros partidos. É um partido com a cara do gaúcho, e meu pai sempre foi um fervoroso trabalhista. Por esses fatores todos eu decidi colocar meu nome à disposição.
JC – Quais são os temas centrais da sua candidatura e prioridades para o Senado?
Lasier – Eu entendo que nada se fará pelo Rio Grande do Sul sem uma mudança orçamentária. O ponto de partida é mexer no pacto federativo. A Constituição diz que estados e municípios têm autonomia, mas não é possível isso acontecer sem recursos. Existe uma grande concentração de tributos na União e, cada vez mais, os estados perdem poder, têm mais compromissos, mas menos recursos. O Rio Grande do Sul é o 6º estado em arrecadação, mas é o 11º em retorno. São R$ 35 bilhões que mandamos para Brasília e em troca recebemos R$ 12 bilhões. A Bahia arrecada só R$ 15 bilhões e recebe de volta R$ 25 bilhões, quase o dobro. Há uma falta de equanimidade no tratamento. Temos de reivindicar um melhor atendimento tributário, mas também fazer uma unificação da alíquota do ICMS. A pedra de toque para o desenvolvimento é a questão financeira. Todo mundo fala que precisamos melhorar a educação, a segurança, a agricultura, a saúde, mas isso tudo é muito vazio se não tivermos mudanças com relação à distribuição dos tributos, entre eles, o Fundo de Participação dos Municípios. O governo central distribui conforme suas conveniências ou simpatias partidárias, e nossos municípios gaúchos têm recebido muito pouco. Então, é preciso mexer na questão tributária através do reestabelecimento do pacto federativo.
JC – O senhor critica fortemente a saída da Ford do Estado, no governo de Olívio Dutra. Mas a empresa acabou sendo condenada pela Justiça a indenizar o Estado...
Lasier – Esse caso não terminou ainda. Quando o governo (Antonio) Britto (PMDB) trouxe a Ford para o Rio Grande do Sul, a empresa adquiriu, através do governo e com grande participação financeira deste, os terrenos de Guaíba. E antecipou, na época, R$ 300 milhões, que hoje vão a muito mais de R$ 1 bilhão, que seriam usados na construção da infraestrutura. É desse dinheiro que o governo do PT foi atrás e ganhou, mas esta ação não terminou. Esse processo ainda pende de julgamento pelo pleno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A Ford, por uma questão de marketing, não quis entrar contra o governo do Rio Grande do Sul por quebra de contrato. A empresa gastou muito para fazer o projeto de instalação no Rio Grande do Sul, contratou consultorias, fez projeto de quais automóveis seriam montados aqui, e isso demandou gastos e contrato. Mas, quando o Olívio assumiu, declarou que não daria dinheiro para multinacional rica. Ele quebrou o contrato a tal ponto que, quando o presidente da Ford, Ivan Pereira, veio ao Rio Grande do Sul, o Olívio não o recebeu, deu-lhe um chá de banco e o mandou ser recebido pelo Zeca Moraes (então secretário estadual de Desenvolvimento e Assuntos Internacionais, PT). Sei disso porque, na época, eu estava na reportagem e acompanhei tudo, além de ter ido a Detroit (EUA), quando uma comitiva de empresários e deputados do governo Britto foi lá agradecer ao presidente mundial da Ford por ter escolhido o Rio Grande do Sul. Jack Nasser disse: “Vamos fazer em Guaíba a fábrica de automóveis mais moderna do mundo, porque o automóvel sempre existirá, a diferença é que serão mais sofisticados”. E confirmou, diante de nós, que viria à inauguração e transformaria Guaíba na cidade mais ajardinada do Rio Grande do Sul. Na semana seguinte, se soube que a Ford não vinha mais por quebra de contrato. Isso foi uma decisão altamente prejudicial à economia do Estado, porque ao não vir a Ford, também não vieram a Goodyear e outras empresas. Na Bahia, houve a criação de milhares de empregos, renda, tributos. Alguém poderá dizer que “o Lasier está aferrado a uma questão do passado”. Sim, a questão é do passado, mas as consequências estamos vivendo hoje.
JC – O público vê uma polarização entre o senhor e Olívio Dutra, muito por conta de sua postura em relação à Ford.
Lasier – Temos divergências muito profundas em questão de desenvolvimento econômico. O Olívio recebeu um governo e o entregou pior ao seu sucessor. Reconheço que ele é uma pessoa honesta, um homem íntegro, mas tem decisões muito desastradas. Ele está muito aferrado a uma política estatizante, à agricultura familiar, que é importante, principalmente, para nós gaúchos, mas só isso não resolve. Temos que avançar e dar alguns passos adiante, em sintonia com o mundo moderno, e o Olívio não acompanha isso. Os grandes investimentos que perdemos são uma triste herança que temos: o Rio Grande do Sul está desprezado, porque criou-se um preconceito de que o Estado não cumpre contratos.
JC – O PSB, que está apoiando José Ivo Sartori (PMDB), e o PDT, há menos de um ano, apoiavam o governo Tarso Genro (PT). O que explica essa mudança?
Lasier – O PDT entrou no governo Tarso contra a vontade do presidente estadual do partido, Romildo Bolzan, e do hoje candidato a governador Vieira da Cunha, além de vários candidatos a deputado federal, entre eles Pompeo de Mattos. Mas, como houve uma decisão de diretório estadual por pequena margem, os principais dirigentes perderam e aí alguns pedetistas entraram no governo. Mas quando obtivemos, junto ao presidente nacional do PDT (Carlos Lupi), a liberação para lançarmos candidatura própria, esses principais aderentes do governo Tarso se desligaram e aceitaram a posição de autonomia do PDT. Eu entendo o PDT como um partido muito grande. Não tem nada que servir de coadjuvante de outros partidos, tem que ser protagonista.
JC – O PDT apoia Dilma Rousseff (PT) em nível nacional. Qual a sua posição?
Lasier – Eu não apoio a Dilma, porque acho que ela não atendeu bem às carências do Rio Grande do Sul. Há quatro anos e meio eu a entrevistei, perguntando se faria a ponte do Guaíba e ela disse que sim, mas o governo dela está terminando e a ponte não tem licenciamento, nem projeto. Ela não cumpriu a promessa da ponte do Guaíba e agora promete o metrô, que é um sonho que temos, mas é irrealizável em curto e médio prazo. Ela também não cumpre o pacto federativo; pelo contrário, deixa os municípios gaúchos e estados como o Rio Grande do Sul à mingua.
JC – Como avalia a sequência dos protestos de 2013?
Lasier – Olha, foi uma das coisas mais emocionantes que vi. Aqueles acontecimentos também determinaram minha decisão de concorrer, pois percebi que a sociedade brasileira, as pessoas de bem estavam começando a reagir, saindo da letargia e protestando. É uma pena que, nos políticos brasileiros, aquilo entrou por um ouvido e saiu pelo outro. O povo brasileiro quer melhores serviços públicos, ética na política, o fim do esbanjamento do dinheiro público, do excesso de ministérios, dos 22 mil cargos de confiança (CCs), do aparelhamento do Estado por um partido único, nada disso a população quer.
JC – Há alguma maneira de a população participar das mudanças, além das eleições? O que acha dos conselhos propostos por Dilma?
Lasier – Esses conselhos populares do decreto da presidente são, antes de mais nada, inconstitucionais. Não resistem a uma avaliação do poder Judiciário. Mas acho que nós tivemos um início de reação. A população percebeu que somos um País rico, temos muitos recursos, solo fértil; temos biodiversidade para produtos farmacêuticos e médicos que nenhum outro país tem, recursos minerais, temos o pré-sal e, no entanto, apesar de sermos a sétima economia do mundo, estamos no 80º lugar no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), um absurdo. A população se deu conta que é mal administrada, então, está na hora de reagir. Espero que essa reação se converta em votos, em gente nova na política.
JC – Acha que, de alguma forma, a população deve participar de políticas de governo?
Lasier – Acho que pode, por meio das leis populares, mas nós não podemos perder o sistema representativo. Ainda é o Congresso Nacional e os Parlamentos estaduais que devem responder, embora não estejam respondendo. Isso pode demorar um pouco, mas nós temos que começar a combater essas más políticas, através dessa representatividade parlamentar.
JC – Com relação à crise da política representativa, uma das questões discutidas é o fim do financiamento privado de campanhas. O que pensa?
Lasier – Nós precisamos de uma reforma política. A ideia de que não existe almoço grátis obriga os eleitos e beneficiários destas vultosas contribuições a retribuir as doações. Temos de encontrar um meio termo em relação à captação de recursos junto à iniciativa privada. Do jeito que está não dá. Mas o financiamento público também é injusto, pois não temos recursos para as carências essenciais da vida brasileira. Além do mais, o que impedirá que clandestinamente haja contribuições para os candidatos que estiverem mais afeiçoados na defesa dos grandes interesses privados?
JC – Como se poderia encontrar esse meio termo?
Lasier – Acho que tem que diminuir o tamanho das ofertas, estabelecer um limite. Nenhum candidato pode receber mais do que um valor “x”, reunidos todos os doadores. É inadmissível, como estamos vendo agora, a presidente Dilma recebendo bilhões, é a que mais está recebendo. Aqui no Estado, o candidato à reeleição é o que mais recebe. Os partidos pequenos não recebem praticamente nada, então, se for estabelecido um teto, iguala um pouco mais.
JC – Isso garante que não vai haver retribuição?
Lasier – Acho que não, porque estabelecendo limites o candidato vai perceber que ele não tem grande obrigação, porque se o empresário doar R$ 300 mil no máximo, isso não vai significar obrigação. Para fins de uma eleição, isso é pouco significativo. Da mesma maneira que também não concordo com a lista fechada, que é voltar ao voto de cabresto, pois as cúpulas decidem quais candidatos devem ser colocados na ponta da lista.
JC – O que acha da regulação da mídia?
Lasier – Há por trás disso a ideia de limitar a liberdade de imprensa. Acho um atraso. Sobre alguns órgãos serem mais poderosos do que outros, é porque são mais competentes. Vivemos em uma economia de mercado, então, há alguns veículos que pagam melhores salários, espalham mais sucursais e emissoras. Isso é competência.
Perfil
Lasier Costa Martins nasceu no município de General Câmara, em 1942. Aos 16 anos de idade, iniciou sua trajetória no rádio, em Montenegro, e fez carreira na imprensa gaúcha. Já instalado em Porto Alegre, ingressou na equipe de esportes da rádio Difusora, aos 17 anos. A partir de 1961, trabalhou na rádio Guaíba, onde permaneceu por 24 anos. Em 1986, deixou o veículo para entrar no grupo RBS, no qual atuou como âncora de telejornal, comentarista e apresentador, com participação na RBSTV e na rádio Gaúcha. Sua entrada na política ocorreu em outubro do ano passado, quando se desligou da RBS para se filiar ao Partido Democrático Trabalhista (PDT), pelo qual se lançou candidato ao Senado Federal, na chapa majoritária composta por Vieira da Cunha (PDT) e Flávio Gomes (PSC). Lasier também é advogado, formado em Direito pela Ufrgs. Exerceu a profissão por 20 anos, mas deixou de advogar para dedicar-se exclusivamente ao jornalismo.