sexta-feira, 19 de setembro de 2014

REDUZIR GASTOS PÚBLICOS PARA RECUPERAR O ESTADO É UMA ILUSÃO



ZERO HORA 19 de setembro de 2014 | N° 17927


DIONE KUHN ROSANE DE OLIVEIRA


ENTREVISTA - “Não adianta só esbravejar,


TARSO GENRO. Candidato do PT a governador

Com um discurso recheado de críticas aos adversários, principalmente a Ana Amélia (PP), o governador Tarso Genro (PT) disse que reduzir gastos públicos como forma de recuperar financeiramente o Estado é uma ilusão. Para Tarso, a solução está no enfrentamento da questão da dívida do Estado com a União, que hoje compromete 13% da receita com as parcelas mensais de pagamento.

O candidato do PT é o quarto e último da série de entrevistas que ZH iniciou nesta semana com os candidatos com melhor desempenho nas pesquisas. As sabatinas foram realizadas conforme a disponibilidade de agenda dos concorrentes.

O que leva o senhor a buscar a reeleição se o seu próprio secretário da Fazenda disse que a situação financeira do Estado é grave e não há uma solução?

É uma advertência que o nosso governo vem fazendo desde o início, da desestruturação financeira do Estado. Um processo de 30 anos que vem se acumulando. O que me leva a buscar a reeleição é a possibilidade de recuperar o Estado de uma maneira diferente da dos nossos adversários. Prometer que vai sair da crise reduzindo os gastos públicos é uma ilusão. Ou uma manipulação de quem não conhece a real situação financeira e econômica do Estado.

O senhor quer dizer que não há o que reduzir?

Se você quer crescer, não tem o que reduzir. Posso citar inúmeros projetos que só puderam ser desenvolvidos em função do tipo de estrutura pública que nós temos. Por exemplo: a política de combate à pobreza no meio rural, os três Planos Safra, o Irrigando a Agricultura Familiar, o Mais Água, Mais Renda, o RS Mais Igual, as políticas de implementação dos parques tecnológicos. Tudo isso foi feito em função da reestruturação que fizemos da máquina pública.

O senhor tem dito que vai aumentar os gastos públicos em saúde, segurança e educação. De onde sairá o dinheiro?

Temos uma forma de financiar o déficit imediato, e estamos preparados para isso. Estamos passando por uma fase da economia brasileira que é indeterminada. Não é um problema do Rio Grande do Sul. O país não tem saída para grandes problemas estruturais sem aumentar o seu crescimento de maneira permanente, estabilizada. A crise mundial bateu no Brasil, mas não bateu no emprego. Isso é um mérito extraordinário do governo Dilma. A nossa suposição e a nossa vontade são de que o país retome o crescimento no próximo período. Se não retomar, não tem saída para o país e para o RS.

O senhor sacou cerca de R$ 5 bilhões dos depósitos judiciais. O estoque com esse valor não existirá no ano que vem. De onde sairá o dinheiro para as despesas de custeio se não houver crescimento da receita?

Utilizamos os R$ 5 bilhões para chegar aos 12% na saúde e continuaremos usando os depósitos mantendo a determinação legal daquele percentual que tem de ficar para pagamento de precatórios e requisições de pequeno valor. O crescimento econômico é o que vai nos permitir manter os programas sociais. A arrecadação própria coloca a máquina do Estado em funcionamento ordinário, mas para nós isso não basta. Isso qualquer um faz. Estamos falando é em dar continuidade às políticas de desenvolvimento.

Mas não há o risco de faltar dinheiro para essas despesas ordinárias?

Da nossa parte, não vai faltar. Porque essas são despesas prioritárias. O que pode entrar em jogo no próximo período, se não tivermos uma política de desenvolvimento no Estado e não for retomado o crescimento no país, é essa quantidade de investimentos que estamos fazendo fortemente.

Que investimento é possível fazer se for aprovada em novembro a mudança no indexador da dívida dos Estados?

Essa mudança abate R$ 15 bilhões da dívida do Estado e abre espaço fiscal imediato para um financiamento de US$ 1 bilhão.

Em que seria investido?

Principalmente em infraestrutura, num plano estadual de logística e transporte, articulado com o governo federal. A abertura desse espaço fiscal é um respiradouro, inclusive para financiar o Estado no próximo período. E é uma política de transição. Nós poderemos nos endividar abatendo esses R$ 15 bilhões? Quem sabe em quatro anos (se endividar) por mais R$ 4 bilhões. Mesmo assim, a dívida vai cair parcialmente na data prevista para sua redução, que é em 2027. Esse sistema de pagamento da dívida é perverso, porque foi feito num momento de alta da inflação no país e de juros altos. Os juros caíram muito de lá para cá, a inflação também caiu muito.

A outra mudança que interessa especialmente ao RS é a redução do percentual de comprometimento da receita do Estado com o pagamento mensal da dívida. Qual a sua expectativa em relação a essa proposta ser aceita pelo governo federal?

Essa é uma questão para tratar a partir de janeiro. Temos de baixar de 13% para 9% o comprometimento. Mas isso depende da correlação de forças e da ação política do governante. Ninguém acreditava, quando começamos a discutir a questão da dívida, que a presidenta mandaria um projeto como esse (o que muda o indexador de correção da dívida), que abate R$ 15 bilhões da dívida. Conseguimos com a capacidade de articulação de nosso governo, com o apoio silencioso, mas firme, da presidenta.

Sua adversária Ana Amélia propõe um encontro de contas entre Estado e governo federal. O valor da dívida do RS seria abatido com o valor dos ressarcimentos da Lei Kandir que não foram repassados ao Estado em anos anteriores. Essa alternativa é viável?

Vejo inviabilidade nisso. É uma proposta meramente formal e ingênua. O governo federal pode dizer “muito bem, eu te passo esses ressarcimentos da Lei Kandir, mas paro com todos os investimentos”. O governo federal investe 10 vezes mais aqui do que os repasses que teria de fazer da Lei Kandir. Portanto, essa é uma visão retórica, formalista para criar uma ilusão de que a solução estaria nesse repasse. A solução está no enfrentamento da questão da dívida.

Na proposta de orçamento para 2015, estão previstos para a folha de pagamento do magistério somente R$ 200 milhões a mais do que o valor previsto para este ano. Isso não cobre nem o aumento de 13,5% que entra em vigor em novembro. Significa que os servidores não devem esperar reajuste para 2015?

O ano de 2015 será o ano de pagamento de todos os acordos feitos com professores, Brigada Militar, técnicos-científicos, Susepe. Essa é a responsabilidade que nós temos. Em relação ao magistério, o próximo governo terá de tratar da questão do piso. Tenho o compromisso com os professores de não mexer no quadro, mas, se eles entenderem que é melhor mexer no quadro e nós adotarmos o piso Fundeb, faremos isso. A saída que propus ao Cpers passa pelos recursos do pré-sal. Propus desenvolver uma campanha nacional para que nós façamos uma redução do percentual de pagamento da dívida de 13% para 9% e que os recursos oriundos dessa redução sejam considerados adiantamento de dívida que o pré-sal vai acumular com os Estados para a área de educação. Pode ser um caminho extraordinário. Não adianta só esbravejar, como os meus adversários esbravejam, é preciso ter propostas. Nós temos uma proposta concreta.

O senhor cumpriu a promessa de acabar com os pedágios privados, criou a EGR, mas são constantes as reclamações sobre o estado de conservação das estradas pedagiadas e não pedagiadas. Por quê?

Queixas constantes? Não tenho ouvido. Temos estradas ruins, médias e boas aqui no Estado. O que sempre ocorreu. As praças da EGR estão fazendo um serviço extraordinário, melhor que as concessionárias. A EGR já recuperou 700 quilômetros, rebaixamos os preços dos pedágios, acabamos com vários pedágios. É claro que, num curto período de tempo, as estradas não estão uma maravilha. Tenho recebido no Interior muitos elogios em regiões em que o trabalho da EGR já chegou. Em regiões que não chegou, tem críticas, mas que não podem ser generalizadas.

O que trava tanto a execução das obras nas estradas?

O Daer estava destroçado, um bom quadro de funcionários desmotivados, os contratos vencidos, e as empresas estavam despreparadas para responder às obras encomendadas. Temos problemas no Ministério Público com investigações, no Tribunal de Contas, inclusive com proibições de entrar em determinadas estradas. Agora, o Daer está reestruturado, funcionando de maneira adequada. Qual é o problema que estamos enfrentando: 40% das empresas ganham licitações e não fazem as obras.

É um problema do sistema de licitações pelo menor preço?

É esse o problema, mas também de despreparo das empresas para fazer o número de obras que estão sendo feitas no Estado. As grandes empreiteiras, que são aquelas que têm responsabilidade técnica, vão para obras mais importantes. E as menos importantes para as empresas, mas não para as comunidades, que são os acessos municipais, não entram, porque são obras de 30, 40 quilômetros. Mesmo assim, tem de ser reconhecido que, nas ligações municipais, nós fizemos o dobro do que os dois últimos governos, embora não tenhamos conseguido alcançar os 104 por problemas de licitação, de contrato e de empresas. E não por problemas de recursos, pois eles foram obtidos por financiamentos internacionais.

O senhor foi surpreendido pela liderança da candidata de Ana Amélia nas pesquisas?

É um processo crescente de despolitização da política do país. Está sendo estabelecida uma visão de que o país tem que começar do zero a nova política. É um equívoco dramático, que pode destroçar a democracia. A minha adversária Ana Amélia vem de fora da política. O que é absolutamente normal na democracia. Então ela aparece como uma novidade. Acho que ela não é. Essa visão de começar do zero lembra o presidente Collor, que levou o país a um impasse dramático.

Os adversários dizem que seu governo foi aparelhado pelo PT e que é possível fazer a máquina mais eficiente. O senhor manteria a mesma estrutura?

É uma visão injusta e eleitoreira. Podemos fazer modificação no próximo período, mas não é para reduzir custos. É para dar mais agilidade nas decisões. Minha adversária diz que vai acabar com o Gabinete dos Prefeitos. É um crime. É a primeria vez que um governo tem estrutura de acolhimento dos prefeitos. Temos enquete que mostra que 80% dos prefeitos acham que foi uma grande conquista. Minha adversária disse que a Fepam e a Secretaria do Meio Ambiente eram estruturas superpostas. Pelo amor de Deus.

O que o senhor pretende fazer para tentar reverter o quadro?

Encaramos com naturalidade a política dos adversários, pois é um momento de exacerbar a crítica. Mas alguns estão passando uma visão não realista do nosso governo para a sociedade. Não considerar um grande evento abater R$ 15 bilhões da nossa dívida pública é equivocado. Interromper nosso projeto agora e começar de novo é negativo para o RS. Digo com a tranquilidade de quem tem experiência administrativa e lutou muito para este Estado melhorar. Voltar para um governo semelhante ao de Yeda Crusius é dramático para o Estado. Até parece que o vice atual de Ana Amélia (Cassiá Carpes) tem caracretísticas semelhantes às do vice da ex-governadora (Paulo Feijó). O Estado poderá ser lançado a uma situação de baixo crescimento e de dificuldade de diálogo com empresários, trabalhadores e movimentos sociais.


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